Fernando Sabino
[...]
Levantava
a perna, e ele levantava também, ao mesmo tempo. Abria os braços e ele fazia o
mesmo. Coçava a orelha, e ele também.
Mas
o que mais me intrigava era a única diferença entre nós dois. Sim, porque um
dia descobri, com pasmo, que enquanto eu levantava a perna esquerda, ele
levantava a direita; enquanto eu coçava a orelha direita, ele coçava a
esquerda. Reparando bem, descobria outras diferenças. O escudo da escola, por
exemplo, que eu trazia colado no bolsinho esquerdo do uniforme, na blusa dele
era no direito.
Para
testar, coloco a mão direita espalmada sobre o espelho. Como era de se esperar,
ele ao mesmo tempo vem com sua mão esquerda, encostando-a na minha. Sorrio para
ele e ele para mim. Mais do que nunca me vem a sensação de que é alguém
idêntico a mim que está ali dentro do espelho, se divertindo em me imitar.
Chego a ter a impressão de sentir o calor da palma da mão dele contra a minha.
Fico sério, a imaginar o que aconteceria se isso fosse verdade. Quando volto a
olhá-lo no rosto, vejo assombrado que ele continua a sorrir. Como se agora
estou absolutamente sério?
Um
calafrio me corre pela espinha, arrepiando a pele: há alguém vivo dentro do
espelho! Um outro eu, o meu duplo, realmente existe! Não é imaginação, pois ele
ainda está sorrindo, e sinto o contato de sua mão na minha, seus dedos aos
poucos entrelaçarem os meus.
Puxo
a mão com cuidado, descolando-a do espelho. Em vez da outra mão se afastar, ela
vem para fora, presa à minha. Afasto-me um passo, sempre a puxar a figura do
espelho, até que ela se destaque de todo, já dentro do meu quarto, e fique à
minha frente, palpável, de carne e osso, como outro menino exatamente igual a
mim.
–
Você também se chama Fernando? – pergunto, mal conseguindo acreditar nos meus
olhos.
–
Odnanref – responde ele, e era como se eu próprio tivesse falado: sua voz era
igual à minha.
–
Odnanref?
Sim,
Odnanref. Fernando de trás para diante. Era em tudo semelhante a mim, menos em
relação à direita e à esquerda, que nele eram o contrário, sendo natural, pois,
que seu nome, isto é, o meu fosse ao contrário também. Por uma coincidência,
Odnanref era o meu nome de guerra, na sociedade secreta Olho de Gato.
–
Por isso mesmo – confirmou Odnanref, dando-me um tapinha nas costas e rindo,
feliz: - Foi você que me desencantou, adotando o meu nome. Senão eu jamais
teria vindo, pois a lei do mundo dos espelhos proíbe terminantemente que a
gente venha ao mundo de vocês. A menos que alguém consiga desvendar o nosso
encanto. O meu era esse, e você adivinhou. Eu só estava esperando que você me
puxasse, como acabou de fazer. [...]
Deslumbrado
com a perspectiva de ter alguém igual a mim, como um perfeito irmão gêmeo, eu
não imaginava as dificuldades que iria enfrentar. A falta de minha imagem no
espelho, por exemplo, era uma delas: me criava problemas para pentear os
cabelos ou escovar os dentes sem poder me ver.
Combinamos
que, a partir de então, ele me substituiria quando eu quisesse, mas jamais
deveríamos ser vistos juntos. Ninguém poderia desconfiar de nossa existência
dupla, pois com isso se acabaria o encanto, significando o seu imediato
regresso, para todo o sempre, ao interior do espelho.
[...]
Fernando
Sabino. O menino no espelho. 44. Ed. Rio de Janeiro: Record, 2004.
Fonte:
Livro – Tecendo Linguagens – Língua Portuguesa – 6º ano – Ensino Fundamental –
IBEP p. 18.
Por dentro do texto:
01 – Anteriormente você estudou
que um texto pode ser visual, verbal ou multissemiótico. Observe as
características do texto que acabou de ler e responda: Ele é verbal, visual ou
multissemiótico? Explique.
Ele
apresenta apenas palavras; portanto, é um texto verbal.
02 – Ao se olhar no espelho, o
menino vê sua imagem, isto é, seu reflexo. É normal que um espelho reflita
imagens invertidas?
Sim.
03 – Localize no texto o
parágrafo que revela que o espelho reflete a imagem de maneira invertida e
identifique um trecho que comprove essa afirmação.
Segundo parágrafo. “[...]um dia descobri, com pasmo, que
enquanto eu levantava a perna esquerda, ele levantava a direita; enquanto eu
coçava a orelha direita, ele coçava a esquerda. Reparando bem, descobria outras
diferenças. O escudo da escola, por exemplo, que eu trazia colado no bolsinho
esquerdo do uniforme, na blusa dele era no direito.”
04 – Releia o trecho a
seguir. “Quando volto a olhá-lo no rosto, vejo assombrado que ele continua
a sorrir. Como, se agora estou absolutamente sério?”
a) O fato narrado
nesse trecho surpreende o menino? Por quê?
Sim,
porque não se trata de algo que acontece normalmente: as imagens do menino que
ele vê refletido não acompanham os movimentos que ele faz diante do espelho.
b) Identifique
nesse trecho a frase que mostra o estranhamento do menino diante do outo que
está dentro do espelho.
“Como, se
agora estou absolutamente sério?”
05 – No texto, o fato de a imagem
do espelho ser a própria imagem do personagem, mas agir de outra maneira,
possibilita uma relação entre o menino e o outro que está dentro do espelho?
Sim, conforme é narrado no texto, o menino conversa com a
imagem do espelho e fica deslumbrado com a possibilidade de existir alguém
igual a ele, como se fosse um irmão gêmeo.
06 – Mesmo agindo de maneira
diferente, o outro que está dentro do espelho é o próprio menino e ele conversa
com sua imagem. Responda:
a) O texto narra
um fato que pode acontecer na realidade ou é uma ficção, criada pela imaginação
do autor?
É uma
ficção, pois, na realidade, é impossível que uma imagem do espelho converse com
alguém.
b) O que você
achou da ideia de um personagem conversar com sua imagem refletida no espelho?
Você já conhecia uma história assim?
Resposta
pessoal do aluno.
07 – Indique a afirmativa que
responde à seguinte questão: Qual foi a intenção do texto ao dar ao personagem
uma possibilidade que não existe na vida real?
a) Mostrar que
uma pessoa pode conversar consigo mesma diante do espelho.
b) Mostrar
que é possível alguém se ver de uma maneira diferente.
c) Revelar que
as coisas são vistas sempre do mesmo jeito.
08 – Releia este diálogo do
texto:
“–
Você também se chama Fernando? – pergunto, mal conseguindo acreditar nos meus
olhos.
–
Odnanref – responde ele, e era como se eu próprio tivesse falado: sua voz era
igual à minha.”
Embora
os diálogos aconteçam entre pessoas diferentes, o menino se reconhece no outro
que está no espelho. Que trecho do diálogo confirma isso?
“[...]
e era como se eu próprio tivesse falado: sua voz era igual à minha.”
Me ajudou muito na atividade de casa agora não vou me preocupar com a tarefa 😁😁
ResponderExcluirme ajudou mais do que pensai
ExcluirObrigada por ter mim ensinando muitíssimo obrigado por tudoh msm😍👍
ExcluirAjudou muito
ResponderExcluirSim com certeza..deu pra refletir melhor
ResponderExcluirMuito obrigado me ajudou muito.
ResponderExcluirObrigada por TUDO 😊
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