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quarta-feira, 7 de outubro de 2020

CRÔNICA - MAR: RUBEM BRAGA - GABARITO 7º ANO

 

     MAR: RUBEM BRAGA  GABARITO P.48

  

      1. A primeira vez que vi o mar eu não estava sozinho. Estava no meio de um bando enorme de meninos. Nós tínhamos viajado para ver o mar. No meio de nós havia apenas um menino que já o tinha visto. Ele nos contava que havia três espécies de mar: o mar mesmo, a maré, que e menor que o mar, e a marola, que é menor que a maré. Logo a gente fazia ideia de um lago enorme e duas lagoas. Mas o menino explicava que não. O mar entrava pela maré e a maré entrava pela marola. A marola vinha e voltava. A maré enchia e vazava. O mar às vezes tinha espuma e às vezes não tinha. Isso perturbava ainda mais a imagem. Três lagoas mexendo, esvaziando e enchendo, com uns rios no meio, às vezes uma porção de espumas, tudo isso muito salgado, azul, com ventos.
      2. Fomos ver o mar. Era de manhã, fazia sol. De repente houve um grito o mar! Era qualquer coisa de larga, de inesperado. Estava bem verde perto da terra, e mais longe estava azul. Nós todos gritamos, numa gritaria infernal, e saímos correndo para o lado do mar. As ondas batiam nas pedras e jogavam espuma que brilhava ao sol. Ondas grandes, cheias, que explodiam com barulho. Ficamos ali parados, com a respiração apressada, vendo o mar…

       3. Depois o mar entrou na minha infância e tomou conta de uma adolescência toda, com seu cheiro bom, os seus ventos, suas chuvas, seus peixes, seu barulho, sua grande e espantosa beleza. Um menino de calças curtas, pernas queimadas pelo sol, cabelos cheios de sal, chapéu de palha. Um menino que pescava e que passava horas e horas dentro da canoa, longe da terra, atrás de uma bobagem qualquer – como aquela caravela de franjas azuis que boiava e afundava e que, afinal, queimou a sua mão… Um rapaz de quatorze ou quinze anos que nas noites de lua cheia, quando ~a maré baixa e descobre tudo e a praia é imensa, ia na praia sentar numa canoa, entrar numa roda, amar perdidamente, eternamente, alguém que passava pelo areal branco e dava boa-noite… Que andava longas horas pela praia infinita para catar conchas e búzios crespos e conversava com os pescadores que consertavam as redes. Um menino que levava na canoa um pedaço de pão e um livro, e voltava sem estudar nada, com vontade de dizer uma porção de coisas que não sabia dizer – que ainda não sabe dizer.

       4. Mar maior que a terra, mar do primeiro amor, mar dos pobres pescadores maratimbas, mar das cantigas do catambá, mar das festas, mar terrível daquela marte que nos assustou, mar das tempestades de repente, mar do alto e mar da praia, mar de pedra e mar do mangue… A primeira vez que sai sozinho numa canoa parecia ter montado num cavalo bravo e bom, senti força e perigo, senti orgulha de embicar numa onda um segundo antes da arrebentação. A primeira vez que estive quase morrendo afogado, quando a água batia na minha cana e a corrente do “arrieiro” me puxava para fora, não gritei nem fiz gestas de socorro; lutei sozinho, cresci dentro de mim mesmo. Mar suave e = oleoso, lambendo o batelão. Mar dos peixes estranhos, mar virando a canoa, mar das pescarias noturnas de camarão para isca. Mar diário e enorme, ocupando toda a. vida, uma vida de bamboleio de canoa, de paciência, de força, de sacrifício sem finalidade, de perigo sem sentido, de lirismo, de energia; grande e perigoso mar fabricando um homem…

       5. Este homem esqueceu, grande mar, muita coisa que aprendeu contigo. Este homem tem andado por aí, ara aflita, ora chateado, dispersivo, fraco, sem paciência, mais corajoso que audacioso, incapaz de ficar parado e incapaz de fazer qualquer coisa, gastando-se como se gasta um cigarro. Este homem esqueceu muita coisa mas há muita coisa que ele aprendeu contigo e que não esqueceu, que ficou, obscura e forte, dentro dele, no seu peito. Mar, este homem pode ser um mau filho, mas ele é teu filho, é um dos teus, e ainda pode comparecer diante de ti gritando, sem glória, mas sem remorso, como naquela manhã em que ficamos parados, respirando depressa, perante as grandes ondas que arrebentavam – um punhado de meninos vendo pela primeira vez o mar…

Julho, 1938

— Rubem Braga, no livro “200 crônicas escolhidas”. Rio de Janeiro: Record, 1986.

 Primeiras impressões

1. Oue imagens e sensações você relacionaria ao texto?

Resposta pessoal.

2. Oue fases da vida do narrador organizam a narrativa de suas experiências de vida junto ao mar? Oue palavras e expressões você observou para concluir isso?

·         infân­cia ("Estava no meio de um bando enorme de meni­nos", "Depois o mar entrou na minha infância ... ", "Um menino de calças curtas ... ");

·         adolescência: (" ... e tomou conta de uma adolescência toda", "Um rapaz de qua­torze ou quinze anos");

·         vida adulta ("mar fabricando um homem ... ", "Este homem").

3.Releia o primeiro e o segundo parágrafos.

a) Com base em que o mar é descrito no primeiro parágrafo?

A descrição foi feita com base na imaginação do narrador, quando criança, com base no que ouviu do único me­nino do bando que conhecia o mar.

b) E no segundo parágrafo?

A des­crição foi feita com base na própria experiência do nar­rador, quando menino, ao ver o mar pela primeira vez.

4. Das experiências de vida do narrador junto ao mar, qual chamou mais sua atenção? Por quê?

Resposta pessoal.

5. Além das experiências pessoais, que experiências cole­tivas de trabalho e de manifestação cultural o narrador associa ao mar?

"mar dos pobres pescadores maratimbas mar das cantigas do catambá, mar das festas como experiências coletivas.      .          

6. O que se pode deduzir sobre o momento presente do narrador: ele vive experiências semelhantes às que vi­veu antes? O que você observou no texto para con­cluir isso?

De modo geral, permite concluir, e muito especialmente nas passagens: "Este homem esqueceu, grande mar, muita coisa que aprendeu contigo. Este homem tem andado por ai , ora aflito, ora chateado, dispersivo, fraco, sem paciência, mais corajoso que audacioso, incapaz de ficar parado e incapaz de fazer qualquer coisa, gastando-se como se gasta um cigarro.

     A crônica na literatu­ra brasileira é bastante variada, mas, de modo geral, seus textos são cur­tos, em comparação a um conto ou a um romance, e trazem um "olhar ar­tístico" para o cotidiano, isto é, para o nosso dia a dia, recortando dele te­mas, acontecimentos, e trabalhando-os no texto de jeito surpreendente, mobilizando emoções, re­flexões e sentimentos na experiência no leitor. As­sim, é um gênero em que o escritor exercita a arte de tratar de coisas sim­ples, de modo profundo, em textos breves.

 SINGULAR E PLURAL

17 comentários:

  1. Muito obrigada você me ajudou muito ☺️☺️

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  2. muito bom professor gostei de seu trabalho

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  3. A resposta da questão 1 é 4 e pessoal mesmo

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