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domingo, 19 de abril de 2020

CORDEL PEDRO CEM


PEDRO CEM
Vou narrar agora um fato
Que há cinco séculos se deu
De um grande capitalista
Do continente europeu
Fortuna como aquela
Ainda não apareceu
Pedro Cem era o mais rico
Que nasceu em Portugal
Sua fama enchia o mundo
Seu nome andava em geral
Não casou-se com rainha
Por não ter sangue real
Em prédios, dinheiro e bens
Era o mais rico que havia
Nunca deveu a ninguém
Todo mundo lhe devia
Balanço em sua fortuna
Querendo dar não podia
Em cada rua ele tinha
Cem casas para alugar
Tinha cem botes no porto
E cem navios no mar
Cem lanchas e cem barcaças
Tudo isso a navegar
Tinha cem fábricas de vinho
E cem alfaiatarias
Cem depósitos de fazenda
Cem moinhos, cem padarias
E tinha dentro do mar
Cem currais de pescaria
Em cada país do mundo
Possuía cem sobrados
Em cada banco ele tinha
Cem contos depositados
Ocupavam mensalmente
Dezesseis mil empregados


Diz a história onde li
O todo desse passado
Que Pedro Cem nunca deu
Uma esmola a um desgraçado
Não olhava para um pobre
Nem falava com criado
Uma noite ele sonhou
Que um rapaz lhe avisava
Que aquele orgulho dele
Era quem o castigava
Aquela grande fortuna
Assim como veio, voltava
Ele acordou agitado
Pelo sonho que tinha tido,
Que rapaz seria aquele
Que lhe tinha aparecido?
Depois pensou: — Ora, sonho
É ilusão do sentido!
Um dia no meio da praça
Ele uma moça encontrou
Essa vinha quase nua
Nos seus pés se ajoelhou
Dizendo: — Senhor, olhai
O estado em que estou…
Ele torceu para um lado
E disse: — Minha senhora,
Olhe a sua posição
E veja o que fez agora.
Reconheça o seu lugar,
Levante-se e vá embora!
— Oh! Senhor! Por este sol,
Que de tão alto flutua,
Lembrai-vos que tenho fome
Estou aqui quase nua
Sou obrigada a passar
Nesse estado em plena rua!
Ele repleto de orgulho
Nem deu ouvido, saiu
E a pobre ergueu-se chorando
Chegou adiante, caiu
Vinha passando uma dama
Que com seu mato a cobriu
Era a marquesa de Évora
Uma alma lapidada.
Tirando seu rico manto
Cobriu essa desgraçada
Ela conheceu que a pobre,
Foi pela fome prostrada.
Levante-se, minha filha!
E pegou-lhe pela mão,
Dizendo à criada dela:
— Vá ali comprar um pão
Que a essa pobre infeliz,
Faltou-lhe alimentação.
Entregando-lhe uma bolsa
Com 42 mil réis,
Apenas tirou dali
Um diploma e uns papéis,
Não consentindo que a moça
Se ajoelhasse a seus pés.
E com aquela quantia
Ela comprou um tear
Tinha mais duas irmãs
Foram as três trabalhar
Dali em diante mais nunca
Faltou-lhe com que passar.
Vamos agora tratar
Pedro Cem como ficou
E o nervoso que sentia
Uma noite em que sonhou
Que um homem lhe apareceu
Disse: — Olhe bem quem sou!
— Que tens feito do dinheiro,
Que me tomaste emprestado?
Meu senhor manda saber
Em que o tens empregado
E por qual razão não cumpre
As ordens que ele tem dado…
Ele perguntou no sono:
Mas que dinheiro tomei?
Até aos próprios monarcas
Dinheiro muito emprestei;
O vulto zombando dele
Disse: Que tu és eu sei.
— Que capital tinha tu
Quando chegaste ao mundo?
Chegaste nu e descalço
Como o bicho mais imundo
Hoje queres ser tão nobre
Sendo um simples vagabundo.
E metendo a mão no bolso
Tirou dele uma mochila
Dizendo: é essa a fortuna
Que tu hás de possuí-la
Farás dela profissão
Pedindo de vila em vila.
Pedro Cem zombando disse:
— Vai agoureira, te some
Tua presença me perturba,
Tua frase me consome,
De qual mundo tu vieste?
Diz-me por favor teu nome?!
— Meu nome, disse-lhe o vulto,
És indigno de saber,
Meu grande superior
Proibiu-me de dizer
Apenas faço o serviço
Que ele mandou fazer.
Despertando Pedro Cem
Daquilo contrariado;
Ter dois sonhos quase iguais
Ficou impressionado,
Resolveu contrafazer
E ficar reconcentrado.
Pensou em tirar por ano
Daquela grande riqueza
Sessenta contos de réis
E dar de esmola a pobreza
Depois, refletindo, disse:
Não se dá maior fraqueza.
Porque ainda que Deus
Querendo me castigar
Não afundará num dia
Meus cem navios no mar
As cem fazendas de gado
Custarão a se acabar
As cem fábricas de tecidos
Que tenho funcionando,
E os parreirais de uvas
Que estão todos safrejando,
Cem botes que tenho no porto
Todo dia trabalhando.
Cem armazéns de fazenda,
As cem alfaiatarias,
As cem fundições de ferro,
Cem currais de pescarias,
As cem casas alugadas,
Cem moinhos, cem padarias.
E as centenas de contos
Nos bancos depositados,
E tudo isso em poder
De homens acreditados,
Ainda Deus querendo isso
Seus planos serão errados.
Pedro Cem naquela hora
Estava impressionado
Quando aproximou-se dele
O seu primeiro criado
E disse: — Aí tem um homem
Diz vos trazer um recado.
— Mande que entre a pessoa!
(Ele ao criado ordenou)
era um marinheiro velho,
chegando ali o saudou.
— Que nova traz, meu amigo?
Pedro Cem lhe perguntou.
Disse o velho marinheiro:
— Venho vos participar,
Que dez navios dos vossos
Ontem afundaram no mar
Morreram as tripulações
Só eu pude me salvar.
— Que navios foram esses?
Perguntou-lhe Pedro Cem.
Respondeu-lhe o marinheiro:
— Foi “Tejo” e “Jerusalém”,
O “Douro” e o “Penafiel”
E os outros eu não sei bem.
Aquele ainda estava ali
Outro portador bateu
O empregado das vacas
Contou o que sucedeu
Incendiaram o mercado
E todo gado morreu
Pedro Cem nada dizia
Ficando silencioso.
Apenas disse: — Na terra
Não há homem venturoso,
Quem se julgar mais feliz,
É pior que cão leproso.
Chegou outro portador
O empregado da vinha,
Disse: — O depósito estourou
Vazou o vinho que tinha
Pedro Cem disse: Meu Deus,
Que sorte triste esta minha!
Saiu aquele entrou outro,
Um cônsul norueguês
Disse: — Nos mares do norte
Andava um pirata inglês,
Noventa navios vossos
Tomou ele de uma vez!
Meu Deus! Meu Deus! O que fiz?
Exclamava Pedro Cem,
Não há homem nesse mundo
Que possa dizer: — Vou bem,
Quando menos ele espera
A negra desgraça vem!
Dos cem navios que tinha
Alguns foram afundados
E outros pelos piratas
Nos mares foram tomados!
Acrescentou a pessoa:
Vinham todos carregados.
Ali mesmo vinha o mestre
Do navio “Flor do Mundo”
Esse fitou Pedro Cem
Com um silêncio profundo
Depois disse: Sr. Marquês,
Dez barcaças foram ao fundo.
Quatro vinham carregadas
Com bacalhau e azeite,
Duas vinham da Suécia
Com queijo, manteiga e leite,
De todas mercadorias
Não tem uma que aproveite.
Quatro dos dez que afundaram
Traziam pérolas e metal
Só da Ilha da Madeira
Vinha um milhão de coral
Topázio, rubi, brilhante,
Ouro, esmeralda e cristal.
Pedro Cem baixou a vista
Nada pôde refletir
Exclamou: Que faço eu?
Devo deixar de existir,
Mas matando-me não vejo
Isso onde pode ir!
Chegou o moço do campo
Tremendo muito assustado
E disse: Senhor Marquês,
Venho aqui horrorizado,
Deu morrinha nas ovelhas
E mal triste em todo gado
Naquele momento entrou
Um rapaz auxiliar
Esse puxando um papel
Disse: — Venho reclamar
Tudo quanto se perdeu
Na barca “Ares do Mar”
Pedro Cem perguntou: Quanto?
Tirou o moço uns papéis
Que se lia, entre brilhantes
Pulseiras, colares, anéis
Um milhão e quatrocentos
E vinte e contos de réis.
Entrou outro auxiliar
Disse: Eu quero o pagamento,
Por tudo que se perdeu
No navio “Chave do Vento”
Que vinha da América do Norte
Com grande carregamento.
Chegou um tabelião
— Dá licença, senhor Marquês?
Venho lhe participar
Que o grande banco francês
Dois alemães e três suíços
Quebraram todos de vez.
— Lá se foi minha fortuna!
(exclamava Pedro Cem)
Ontem fui milionário
Hoje não tenho um vintém
Só mesmo na campa fria
Eu hoje estaria bem!
Dando balanço nos bens
Quis até desesperar
Tudo quanto possuía
Não dava para pagar
Nem pela décima parte
Os prejuízos do mar.
Exclamava: Oh! Pedro Cem,
Que será de ti agora?!
O pouco que me restava
A justiça fez penhora!
Pedro Cem de agora em diante
Vai errar de mundo a fora!
Cumprir esta sorte dura
Que a desventura me deu
Talvez muitas vezes vendo
Aquilo que já foi meu
Em lugar que não se saiba
Quem neste mundo fui eu.
Ali no terraço mesmo
Forrando o chão se deitou
Às onze e meia da noite,
No sono conciliou,
No sono sonhando viu
O rapaz que lhe falou.
Aquele perguntou: Pedro,
Como se foi na empresa?
Já estais conhecendo agora
Quanto é grande a natureza?
Conheceste que teu orgulho
Foi quem te fez a surpresa?
Metendo a mão na algibeira
Dali um quadro tirou
Onde havia dois retratos
Que a Pedro Cem mostrou
— Conheces estes retratos?
O rapaz lhe perguntou.
Via-se naquele quadro
Uma dama bem vestida
Pedro Cem disse no sonho:
Esta é minha conhecida,
A outra uma pobre moça,
Como fome, no chão caída?
Perguntou-lhe o rapaz:
Quem é essa conhecida?
— É a marquesa de Évora,
E esta, que está caída?
— Essa é uma miserável,
Dessa classe desvalida.
O rapaz puxou outro quadro
Verde da cor da esperança
Onde se via um monarca
Suspendendo uma balança
Estava pesando nela
Caridade e confiança.
Mostrou-lhe mais 4 quadros
Que Pedro Cem conheceu,
Tinha a marquesa de Évora
Quando a bolsa a pobre deu,
Que estirou a mão dizendo:
— Toma o dinheiro que é teu.
No quadro via-se um anjo
Assim nos diz a história,
Com uma flor onde lia-se:
“Jardim da Eterna Glória”
presenteada por Deus
esta palma da vitória.
Quem planta flores, tem flores
Quem planta espinho tem espinho
Deus mostra ao espírito fraco
O que nega ao mesquinho
A virtude é um negócio
Boa ação um pergaminho
Depois que ele acordou
Triste e impressionado
Interrogava a si próprio:
— Porque sou tão desgraçado?
Achou de lado a mochila,
A que ele havia sonhado.
— Será esta a tal mochila
Que o fantasma me mostrou?
É esse o homem que em sonho
Em desespero exclamou,
Na noite que a cruel sina,
Em sonho me visitou?
De tudo restava apenas
A casa de moradia
Essa mesma embargaram
Antes de findar-se o dia,
Então disse Pedro Cem:
— Cumpriu-se a tal profecia!
Lançando mão da mochila
Saiu no mundo a vagar
Implorando a caridade,
Sem alguém nada lhe dar
Por umas 5 ou 6 vezes
Tentou se suicidar.
Ele dizia nas portas:
Uma esmola a Pedro Cem
Que já foi capitalista
Ontem teve, hoje não tem
A quem já neguei esmola
Hoje a mim nega também.
Foi ele cair com fome,
Na casa daquela moça
Quando foi a porta dele
Com fome, fria e sem força
Que ele não quis olhá-la
E a marquesa deu-lhe a bolsa.
A criada o viu cair,
Exclamou: — Minha senhora,
Anda ver um miserável,
Que caiu de fome agora!
— Onde? Perguntou a moça,
Ana lhe disse: ali fora!
A moça disse à criada
Que trouxesse leite e pão
Aproximou-se dele
Disse: O que tens, meu irmão?
Bateste em todas as portas,
Não encontraste um cristão?
Senhora! Se vós soubesse
Quem é este desgraçado,
Não abriria a porta
Nem dava esse bocado,
Respondeu ela: O conheço,
Porém esqueço o passado.
Recordo-me que a marquesa
Fez minha felicidade,
Viu-me caída, com fome,
Teve de mim piedade,
Deu-me com que comprar pão
E esta propriedade.
Pedro Cem se levantou,
Disse: Obrigado, e saiu
Andando duzentos passos
Tombou em terra e caiu
E umas frases tocantes
Em alta voz proferiu:
Vai unir-se a terra fria
O que não soube viver,
Soube ganhar a fortuna
Mas não a soube perder,
Se tenho estudado a vida
Tinha aprendido a viver.
Foi como a corrente d’água,
Que pela serra desceu
Chegou o verão secou
Ela desapareceu
Ficando só os escombros
Por onde a água correu!
Eu tive tanta fortuna,
Não socorri a ninguém,
E todos que me pediram
Eu nunca dei um vintém,
Hoje eu preciso pedir,
Não há quem me dê também!
Não desespero, pois sei
Que grande crime expio
Nasci em berço dourado
Dormi em colchão macio
Hoje morro como os brutos,
Neste chão sujo e frio…
Foram as últimas palavras
Que ele ali pronunciou
Margarida, aquela moça
Que a marquesa embrulhou
Botou-lhe a vela na mão
Ali mesmo ele expirou.
A Justiça examinando
Os bolsos de Pedro Cem
Encontrou uma mochila
E dentro dela um vintém
E um letreiro que dizia:
“Ontem teve, hoje não tem.”
por Leandro Gomes de Barros.


CORDEL O LOBISOMEM E O CORONEL


O Lobisomem e o Coronel

Era uma vez um maldito
Avarento e orgulhoso
Me refiro a Benedito
Um coronel poderoso
O que ele mais gostava
Era as rezes que criava
Todas de primeira linha
Com os olhos tudo comia
Em nenhum baú cabia
Todo o ouro que ele tinha

No interior da fazenda
Vivia um vaqueiro pobre
Morando numa tapera
Não tinha terra, nem cobre
Ao invés de mulher bela
Possuía uma cadela
Para lhe acompanhar
E a fome como fadiga
Remoendo na barriga
Só pra lhe incomodar

Dos bichos o mais querido
Era a vaca Belezura
Que o coronel Benedito
Lhe tratava com ternura
Cruzando os campos floridos
Esbanjando formosura


E Maria dos Anjos sua filha
A mais bela de toda a região
Tinha os olhos da cor do arco-íris
E a voz da codorna do sertão
O cabelo de deusa, os pés de miss
Como se fosse um anjo que saísse
Do altar divinal da inspiração


João por Belezura tinha muito zelo
Cuidava da vaca como um cão fiel
Porque já sabia que o coronel
Não perdoaria nenhum desmantelo



Dona Preta estava num sono brutal
Quando a lua cheia na noite reinava
Com o uivo assombroso a Preta acordava
E um grande mugido vindo do curral

 

Da janela viu um grande animal
Com brasa nos olhos faminto a rosnar
Era o lobisomem monstro de azar
Amaldiçoada, cruel criatura
Que naquela hora comeu Belezura
E Dona Preta aflita se pôs a gritar
Dona Preta estava bastante assustada
Muito apavorada com tudo que viu
Com medo danado saiu na carreira
Sem eira nem beira pra o armário fugiu


Com o grito todos saíram
Seguindo o encalço do cão
Com um lampião clareando
Todos de rifle na mão
Depois que nada encontrou
O coronel se irritou
E começou a esbravejar
Como quem perde o juízo
Dizendo esse prejuízo
Alguém vai ter que arcar


Na tarde do outro dia
Não tendo alguém para culpar
O coronel Benedito
Começa deabafar
Nas costas de João Vaqueiro                               
Bate só pra se vingar


O coronel furioso
Se pôs dizendo a gritar
Nós estamos preparados
Se o lobisomem voltar

Com a outra lua cheia
Depois de um mês passado
Os jagunços no curral
Tomando conta do gado
Quando um uivo anunciava
Que o lobisomem chegava
Eles em grande aflição
Pediam força a Jesus
Rezando e beijando a cruz
Com medo da maldição

E todos entricheirados
Começam a se arrepiar
Depois do segundo uivo
Sentiram a alma gelar
Ouvindo um brado assasino
Junto um grito feminino
Vindo da sala de estar

 

Quando o coronel, naquela tensão
Da voz de Maria o grito escutou
Percebeu que a fera se aproximou
Furtando o tesouro do seu coração
Mas o coronel de rifle na mão
Pede a cabroeira pra casa cercar
E se por ventura o monstro encontrar
Não é pra temer o grande conflito
E sim apontar para o bruto maldito
Puxar o gatilho e a bala cantar

Benedito ao entrar na casa grande
Ouviu gritos dos homens lá de fora
Sons de ossos quebrados e ganidos
E os cabras morrendo sem demora
Escutando o uivar do anticristo
E só o lobo sobrou naquela hora

 

Benedito assombrou-se, pois sentia
Que era ele o capeta e mais ninguém
Parecendo ansioso como quem
Viu que a morte de perto o perseguia
Na pisada do monstro, o chão rangia
No momento um trovão do céu caiu
Lampião se apagou, fera gruniu
As canelas do velho amoleceram
Quando os olhos de fogo apareceram
A mandíbula mortífera se abriu
Se o final dessa história
Vocês quiserem saber
Pergunte ao cego que a luz
Dos olhos não pode ver
Mas que ouviu da cadela
Numa conversa com ela
Que a tudo pôde ver


Essa é a minha sina
Viver sofrendo na vida
De não ter nenhum dos olhos
Mas ter a língua comprida


Não tenho cobiça nem falo mentira
Só digo a verdade, não sou cego bobo
O homem é do lobo o que o lobo é do homem
É que o homem é do homem o mais terrível lobo

 

João fez um bucho em Maria
Com nove meses e um dia
Numa noite de luar
Quando a criança nasceu
O sertão estremeceu
Pôs-se o inferno a chorar


Até nos dias de hoje
É possível se avistar
Nas noites de lua cheia
Uma cadela a ladrar
E um cego andando sem guia
Filho de João e Maria
Com o rabo a balançar


CORDEL A CHEGADA DE LAMPIÃO NO CÉU


A CHEGADA DE LAMPIÃO NO CÉU
Rodolfo Coelho Cavalcanti


Lampião foi no inferno
 depois no céu chegou
São Pedro estava na porta
Lampião então falou:
- Meu velho não tenha medo
Me diga quem é São Pedro
E logo o rifle puxou

2
São Pedro desconfiado
Perguntou ao valentão
Quem é você meu amigo
Que anda com este rojão?
Virgulino respondeu:
- Se não sabe quem sou eu
Vou dizer: sou Lampião.

3
São Pedro se estremeceu
Quase que perdeu o tino
Sabendo que Lampião
Era um terrível assassino
Respondeu balbuciando
O senhor... está... falando...
Com... São Pedro... Virgulino!

4
Faça o favor abra esta porta
Quero falar com o senhor
Um momento meu amigo
Disse o santo faz favor
Esperar aqui um pouquinho
Para olhar o pergaminho
Que é ordem do Criador

5
Se você amou o próximo
De todo o seu coração
O seu nome está escrito
No livro da salvação
Porém se foi um tirano
Meu amigo não lhe engano
Por aqui não fica não

6
Lampião disse está bem
Procure que quero ver
Se acaso não tem aí
O meu nome pode crer
Quero saber o motivo
Pois não sou filho adotivo
Pra que fizeram-me nascer?

7
São Pedro criou coragem
E falou pra Lampião
Tenha calma cavalheiro
Seu nome não está aqui não
Lampião disse é impossível
É uma coisa que acho incrível
Ter perdido a salvação

8
São Pedro disse está bem
Acho melhor dar um fora
Lampião disse meu santo
Só saio daqui agora
Quando ver o meu padrinho
Padre Cícero meu filhinho
Esteve aqui mas foi embora

9
Então eu quero falar
Com a Santa Mãe das Dores
Disse o santo ela não pode
Vir aqui ver seus clamores
Pois ela está resolvendo
Com o filho intercedendo
Em favor dos pecadores

10
Então eu quero falar
Com Jesus crucificado
Disse São Pedro um momento
Que eu vou dar o seu recado
Com pouco o santo chegou
Com doze santos escoltado

11
São Longuinho e São Miguel,
São Jorge, São Simão
São Lucas, São Rafael,
São Luiz, São Julião,
Santo Antônio e São Tomé,
São João e São José
Conduziram Lampião

(continua)

CORDEL MACAÉ


MACAÉ EM CORDEL
POESIA POPULAR
Aldo Cesar Frota Vasconcellos

Preste atenção, meu amigo
Que eu agora vou contar
a história dessa cidade
que nasceu a beira-mar,
e nela um povo indígena
vivia sempre a pescar.

Acontece que os indígenas
é que eram os verdadeiros
moradores dessa terra,
anteriores brasileiros;
eram homens e mulheres
que chegaram aqui primeiro.

E os que chegaram primeiro,
com sua época e vez,
aqui andaram e comeram,
e guerrearam tanta vez,
foram, um dia, dominados
pelo povo Português.

Mas a cultura nativa
resiste pro nosso bem,
pois dos índios nós herdamos
muitas coisas que convém,
que até este belo nome
é indígena também.

Macaé: Macaba doce,
dizem uns historiadores.
Os jesuítas é quem sabem,
forma colonizadores,
difundindo por aqui,
nobres e santos valores.

Outros autores, porém,
dizem que assim não é,
pois o verdadeiro nome
da Villa de Macahé
surgiu como rio dos bagres
que os índios chamam de Miquié.


Da aldeia dos Goytacazes,
eram esses arredores;
o povos que aqui moravam
como grande caçadores,
vivendo entre as restingas,
eram exímios corredores.


Porém sempre apareciam
das bandas do Cabo Frio
bravos guerreiros Tamoios,
homens fortes e arredios,
atacando os Goytacazes
com coragem e muito brio.

***


Macaé já foi chamada
Princesinha do Atlântico;
Cidade clara de Luz,
divina como num cântigo;
Capital do Outro Negro,
nesses nossos tempos quânticos.


A igreja de Sant’Anna
foi a edificação
inicial de Macaé,
pela localização,
pois, topograficamente,
garantia a proteção.


Mas por ser berço de mar,
terra de muitos amores,
sempre surgiam piratas
roubando navegadores;
muitos crimes e devassas
que espalhavam muitas dores.


E por isso, nesta época,
com ordem do Imperador,
mandou-se então construir
esse forte protetor,
e em mil seiscentos e treze
sua construção começou.


O Forte Marechal Hermes
bem cumpriu sua missão
e assim fez-se exemplo de
luta e dedicação,
sendo hoje, segurança,
para o bem dessa nação.

Foi então que a nossa Villa
atingiu maioridade;
mil, oitocentos e treze
fez-se a natalidade:
da vinte e nove de julho
Macaé virou cidade.

***

Dois Pedros Imperadores:
livros dizem que assim é;
o Primeiro, todos sabem,
gostava muito de mulher,
e namorava... escondido
nas praias de Macaé.

Talvez, Dom Pedro Segundo
não tivesse tanto amor
pelas nossas cercanias,
um lugar de muita dor;
inclusive, de um crime...
planejado com terror.
Freguezia Carapebus:
uma família inteira
fora um dia, chacinada
da mais cruenta maneira,
sem aos menos permitirem
a clemência derradeira.

Motta Coqueiro foi preso
sem nem mesmo protestar.
Ele e mais alguns escravos,
nem quiseram interrogar,
porque o povo já pedia
pros culpados condenar.

Motta Coqueiro, porém,
até o fim da prisão,
sustentou ser inocente,
sem dizer contradição,
mas os jornais atiçavam
a ira da população.


Num julgamento apressado,
os juízes por inteiro,
pra agradar a opinião,
atuaram em destempero
pois condenaram à morte
O ilustre Motta Coqueiro.



Ao pé da forca, porém,
um dia a Lenda dirá,
que uma terrível praga
o condenado lançará:
“Por 100 anos, Macaé
o progresso não verá”.


A polêmica da época,
e sua repercussão,
fez surgir muitos protestos
por quase toda nação,
chegando na Capital,
chamou logo atenção.


E após estudar o caso
com calma e paciência,
Dom Pedro enfim, decidiu:
“No fundo a clemência
Cumprirá, em novos crimes,
informal jurisprudência”.


Foi assim que aquele crime
figura no magistrado,
sendo, hoje, em todo curso
de Direito estudado:
a última Pena de Morte
no país executada.


Nuca se soube, porém,
se a tal praga funcionou,
e a Fera de Macabu
na memória aqui ficou.
Mas, verdade é que a cidade
por muito tempo estagnou.

***
Agora muita atenção!
Porque nesse meu sexteto
escrevo de plantas mortas,
animais e esqueletos,
que após milhares de anos
soltam gases sulfuretos.

Não se espante, cara amiga,
se neste simples folheto
falo de coisas estranhas
como orgânicos gravetos,
que, por um processo químico,
viram hidrocarbonetos.


É que o combustível fóssil
tem a ver co’essa cidade,
que o petróleo descoberto
com tanta engenhosidade
fez Macaé, no Brasil,
ganhar popularidade!

Pois foi nos anos setenta,
continuando vosso escriba,
que chegaram por aqui,
engenheiros caraíbas,
e após estudos fizeram...
grande porto na Imbetiba!


E esse por hoje é
muito famoso, aliás,
pois dali embarcam homens,
mulheres eventuais,
construindo essa potência
Que se chama Petrobrás.


De plataformas longínquas
sai a riqueza do oceano.
Primeiro o gás natural,
o propano e o butano;
depois milhões de barris,
explorados todo ano.


E aproveito agora aqui,
para enfim, homenagear
aqueles que, tristemente,
se ausentaram de seu lar:
são mártires do progresso
que morreram em alto-mar.


Neste cordel prosseguindo,
vou falando com amor,
que a evolução tecnológica
tem a seu viés de dor;
essa moeda tem dois lados:
da beleza e do horror.


Pois Macaé também viu
coisas boas se acabando,
muitas árvores morrendo,
Rua da Praia se estreitando,
a violência que campeia
e as mazelas aumentando.

Pois há muita poluição,
muito trânsito caótico;
e com tantos estrangeiros,
fez-se um povo poliglótico,
e tanto stress que nos faz
cada vez mais neuróticos.


Alguns dizem que assim é,
de uma forma natural,
o progresso sempre trás
lado bom e lado mau,
pois no homem sempre existiu,
convivendo o bem e o mal.


Compreendo esse argumento,
porém faço objeção,
pois que tudo se pode
tirar alguma lição.
Deus do Amor no coração.


E o amanhã só Deus sabe,
como diz nosso povo.
não se faz novo começo,
pintinho não volta pro ovo;
mas pode hoje fazer,
quem sabe, um futuro novo.


Vou ficando por aqui,
quero a história preservada
e homenageio ao final,
nesta singela toada,
o nome do nosso ilustre
Antônio Alvarez Parada.


Terminando vou-me embora;
vou-me embora ainda não.
e eu tivesse ido embora,
eu num tava aqui mais não:
vou rimar devagarinho,
continuar mais um pouquinho,
prosseguindo esta canção.


sexta-feira, 3 de abril de 2020

CORDEL CORONA VÍRUS INTERPRETAÇÃO


Coronavírus em cordel


Ave Maria, minha gente,
Que desmantelo total
Um tal de Coronavírus
Fez rebuliço geral
Veio das bandas da China
Essa infecção viral.

O cabra tem logo febre
Sem conseguir controlar
Tosse feito um condenado
Difícil até respirar!
Essa doença danada
Se transmite pelo ar.

Espirro, tosse, catarro
Levam contaminação
A saliva quando fala
Também leva infecção
O vírus também se espalha
Em um aperto de mão.

Como gripe e resfriado,
Precisamos prevenir
Cobrindo a boca e o nariz
Na hora em que for tossir
E objetos pessoais
Não podemos dividir.

Evitar lugar lotado
Com muita aglomeração
Limpar bem os ambientes
E lavar sempre a nossa mão
Esfregar bem direitinho
Usando água e sabão.

Use máscara, álcool em gel
E esse hábito não mude
Se estiver muito doente
Vá ao Posto de Saúde
Pois pra gente controlar
Precisa ter atitude.

Não só pro Coronavírus
Esse cordel vai servir
Todo resfriado ou gripe
Precisamos prevenir
Cuidar bem do nosso corpo
Pra doença não surgir.

Vamos s'imbora cuidar!
Tá todo mundo informado!
Não quero Coronavírus
E nem nenhum resfriado!
Agora é só me seguir:
"Cordel Personalizado"!

(Anne Karolynne)

01) O que é um cordel? Podemos dizer que ele tem caráter informativo?

02) Copie do cordel um vocativo, explicando seu raciocínio:

03) De onde veio o Coronavírus?

04) Transcreva do texto uma interjeição, dizendo o que ela expressa:

05) Localize no cordel uma comparação, explicando-a:

06) Quais são os sintomas do Coronavírus?

07) Como tal doença é transmitida?

08) Quais são as medidas de prevenção que devem ser tomadas?

09) Quando se deve procurar o Posto de Saúde? Por quê?

10) Copie do cordel exemplos de oralidade:

11) Que mensagem o cordel transmite?

12) Como podemos dividir o texto em começo, meio e fim? Delimite-os:

13) Quantas estrofes compõem o cordel? Quantos versos em cada uma delas?

14) De que par de rima você mais gostou? Justifique sua resposta:

domingo, 26 de fevereiro de 2017

CORDEL TEORIA EM CORDEL


Literatura de Cordel
É poesia popular,
É história contada em versos
Em estrofes a rimar,
Escrita em papel comum
Feita pra ler ou cantar.


A capa é em xilogravura,
Trabalho de artesão,
Que esculpe em madeira
Um desenho com ponção
Preparando a matriz
Pra fazer reprodução.


Mas pode ser um desenho,
Uma foto, uma pintura,
Cujo título, bem à mostra,
Resume a escritura.
É uma bela tradição,
Que exprime nossa cultura.





Os folhetos de cordel
Nas feiras eram vendidos
Pendurados num cordão
Falando do acontecido,
De amor, luta e mistério,
De fé e do desassistido.


A minha literatura
De cordel é reflexão
Sobre a questão social
E orienta o cidadão
A valorizar a cultura
E também a educação.

Mas trata de outros temas:
Da luta do bem contra o mal,
Da crença do nosso povo,
Do hilário, coisa e tal
E você acha nas bancas
Por apenas um real.

O cordel é uma expressão
Da autêntica poesia
Do povo da minha terra
Que luta pra que um dia
Acabem a fome e a miséria,
Haja paz e harmonia.