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sexta-feira, 26 de maio de 2017

INTERPRETAÇÃO EM CODIGO

EM CÓDIGO (Fernando Sabino)
1.Fui chamado ao telefone. Era o chefe de escritório de meu irmão:
2.– Recebi, de Belo Horizonte, um recado dele para o senhor. É uma mensagem meio esquisita, com vários itens, convém tomar nota. O senhor tem um lápis aí?
3.– Tenho. Pode começar.
4.– Então lá vai. Primeiro: minha mãe precisa de uma nora.
5.– Precisa de quê?
6.– De uma nora.
7.– Que história é essa?
8.– Eu estou dizendo ao senhor que é um recado meio esquisito. Posso continuar?
9.- Continue.
10.– Segundo: pobre vive de teimoso. Terceiro: não chora, morena, que eu volto.
11.– Isso é alguma brincadeira.
12.– Não é não. Estou repetindo o que ele escreveu. Tem mais. Quarto: sou amarelo, mas não opilado. Tomou nota?
13.– Mas não opilado – repeti, tomando nota.  – Que diabo ele pretende com isso?
14.– Não sei não senhor. Mandou transmitir o recado, estou transmitindo.
15. – Mas você há de concordar comigo que é um recado meio esquisito.
16. – Foi o que eu preveni ao senhor. E tem mais. Quinto: não sou colgate, mas ando na boca de muita gente. Sexto: poeira é a minha penicilina. Sétimo: carona, só de saia. Oitavo…
17.– Chega! – protestei estupefato. – Não vou ficar aqui tomando nota disso, feito idiota.
18.- Deve ser carta em código, ou coisa parecida – e ele vacilou: Estou dizendo ao senhor que também não entendi, mas enfim… Posso continuar?
19.– Continua. Falta muito?
20.– Não, está acabando: são doze. Oitavo: vou, mas volto. Nono: chega à janela, morena. Décimo: quem fala de mim tem mágoa. Décimo primeiro: não sou pipoca mas também dou meus pulinhos.
21.– Não tem dúvida, ficou maluco.
22.– Maluco não digo, mas como o senhor mesmo disse, a gente até fica com ar meio idiota… Está acabando, só falta um. Décimo segundo: Deus, eu e o Rocha.
23.– Que Rocha?
24.– Não sei. É capaz de ser a assinatura.
25.– Meu irmão não se chama Rocha, essa é boa!
26.– É, mas que foi ele que mandou, isso foi.
27.Desliguei, atônito, fui até refrescar o rosto com água, para poder pensar melhor. Só então me lembrei. Haviam-me encomendado uma crônica sobre essas frases que os motoristas costumam pintar, como lema, à frente dos caminhões . Meu irmão, que é engenheiro e viaja sempre pelo interior fiscalizando obras, prometera ajudar-me, recolhendo em suas andanças farto e variado material. E ele viajou, o tempo passou, acabei esquecendo completamente do trato, na suposição de que o mesmo lhe acontecera.
28.        Agora, o material ali estava. Era só fazer a crônica. Deus, eu e o Rocha! Tudo explicado! Rocha era o motorista, Deus era Deus mesmo, e eu, o caminhão.

I – Marque com um X o sinônimo da palavra ou expressão destacada.
1. Em: “É uma mensagem meio esquisita, com vários itens, convém tomar nota…”(par. 2). A expressão em negrito pode ser substituída por:
a. (   ) assinalar          b.(   ) observar          
c.(   ) escrever          d.(   ) guardar

2. Na frase: “Que história é essa?” (par. 7), a palavra em negrito significa:
a.(   ) fato                    b.(   ) complicação    
 c.(   ) chateação      d.(   ) anedota

3. Em: “… pobre vive de teimoso” (par. 10), a expressão em negrito pode ser substituída por:
a.(   ) porque é persistente 
 b.(   ) porque é desobediente
c.(   ) porque é rebelde              
 d.(   ) porque é corajoso

4. Em: “Isso é alguma brincadeira.” (par. 11) a palavra em negrito significa:
a.(   ) piada       b.(   ) passatempo 
 c.(   ) jogo       d.(   ) divertimento

5. Em: “Foi o que eu preveni ao senhor”, (linha 16), a palavra em negrito significa:
a.(   )chegar antes de    
 b.(   ) avisar com antecedência    
 c.(   ) impedir que se realize  
d.(   ) aconselhar com consideração

6. Em: “…carona, só de saia.” (par. 16), a expressão em negrito pode ser entendida como:
a.(   ) só se quiser usar saia       b.(   ) só se não usar calça comprida 
c.(   ) só se for mulher              d.(    ) só se estiver de saia

7. Em: “Chega! – protestei estupefato.” (par. 17), a palavra em negrito significa:
a.(   ) afirmei      b.(   ) assegurei       
 c.(   ) reclamei   d.(   ) declarei

8. Em: “…protestei, estupefato.” (par. 17), a palavra em negrito significa:
a. (   ) amedrontado                   b.(   ) enraivecido 
 c.(   ) desolado                         d.(   ) abobalhado

9. Em: “Não vou ficar aqui tomando nota disso, feito idiota.” (par. 17), a expressão em negrito tem o mesmo significado que:
a.(   ) como pessoa desocupada        b.(   ) como quem não quer nada
c.(   ) como irresponsável            d.(   ) como bobo

10. Em: “Deve ser carta em código…” (par. 18), a expressão em negrito pode ser entendida como:
a.(   ) sinais secretos    b.(   ) fórmulas mágicas    
 c.(   ) letras diferentes  d.(   ) palavras de outra língua

11. Em: “… e ele vacilou…” (par. 18) a palavra em negrito significa:
a.(   ) caminhou sem firmeza  
b.(   ) mostrou-se inseguro     
c.(   ) estremeceu          d.(   ) abalou-se

12. Em: “…quem fala de mim tem mágoa…” (par. 20), a palavra  em negrito significa:
a.(   ) pena                  b.(   ) sofrimento                                           c.(   ) inveja                 d.(   ) raiva

13. Em: “Desliguei atônito…” (par. 27) a palavra em negrito significa:
a.(   ) atordoado                     b.(   ) amedrontado       c.(   ) enfurecido                     d.(   ) revoltado

14.Em: “… e viaja sempre pelo interior…”(par. 27), a palavra em negrito significa:
a.(   ) que está dentro de            
b.(   ) regiões distantes da capital 
 c.(   ) que é interno de          d.(  ) que se situa entre

15. Em: “…fiscalizando obras…” (par. 27), a palavra em negrito significa:
a.(   ) vigiando                               b.(   ) examinando                                         c.(   ) velando                                 d.(   ) cobrando

16. Em: “…recolhendo em suas andanças…”(par. 27), a palavra em negrito significa:
a.(   ) recebendo                            b.(   ) levando                                                  c.(   ) classificando                        d.(   ) reunindo

17. Em: “… suas andanças…” (par. 27) a palavra em negrito tem o mesmo significado que em:
a.(   ) negócios                                 b.(   ) trabalhos                                               c.(   ) viagens                                   d.(   ) passos

18. Em: “…acabei me esquecendo completamente do trato…” (par. 27) a palavra em negrito significa:
a.(   ) contrato                                 b.(   ) acordo                                                     c.(   ) tratamento                             d.(   ) promoção

19. Em: “…na suposição de que o mesmo lhe acontecera…” (par. 27), a palavra em negrito significa:
a.(   ) ideia                                       b.(   ) observação                                              c.(   ) opinião                                    d.(   ) atenção

II – Marque com um X a alternativa correta de acordo com o texto.
20. O nome da crônica está ligado a uma frase enunciada pelo:
a.(   ) moço do escritório          b.(   ) narrador                c.(   ) irmão do narrador           d.(   ) motorista de caminhão














RESPOSTAS:
I – 1. c      2. D    3. A     4. A      5. B      6. C     7. C       8. D     9. D      10. A      11. B     12. C      13. a      14. B       15. B      16. D     17. C     18. B   19. A
II – 20. A    21. B      22. A      23. B     24. C     25. c   26. D
As respostas das questões 27 a 30 poderão ter sido dadas com outras palavras. O importante é ter mantido a ideia que o texto apresenta.
III – 27. Após receber o recado, o narrador sentiu-se confuso, atordoado, e procurou refrescar o rosto com água fria para aclarar as ideias.
28. O narrador queria pensar melhor no recado recebido para ver se compreendia o que o irmão lhe queria dizer com o recado.
29. O narrador refere-se às frases comumente encontradas em parachoques de caminhões  que o irmão lhe prometera conseguir e que lhe serviriam para escrever a crônica encomendada.

30. O narrador refere-se à compreensão da mensagem toda e, em especial, da frase “Deus, eu e o Rocha”, uma vez que ele pode entender que “eu” era o caminhão e “Rocha”, o nome do motorista.

sexta-feira, 5 de maio de 2017

A MORTE DA TARTARUGA 6º ANO

A morte da tartaruga
    O menininho foi ao quintal e voltou chorando: a tartaruga tinha morrido. A mãe foi ao quintal com ele, mexeu na tartaruga com um pau (tinha nojo daquele bicho) e constatou que a tartaruga tinha morrido mesmo. Diante da confirmação da mãe, o garoto pôs-se a chorar ainda com mais força. A mãe a princípio ficou penalizada, mas logo começou a ficar aborrecida com o choro do menino.
    — Cuidado, senão você acorda seu pai!
    Mas o menino não se conformava. Pegou a tartaruga no colo e pôs-se a acariciar-lhe o casco duro. A mãe disse que comprava outra, mas ele respondeu que não queria, queria aquela, viva! A mãe lhe prometeu um carrinho, uma bicicleta, lhe prometeu uma surra, mas o pobre menino parecia estar mesmo profundamente abalado com a morte do seu animalzinho de estimação.
    Afinal, com tanto choro, o pai acordou lá dentro, e veio, reclamando, ver de que se tratava. O menino mostrou-lhe a tartaruga morta. A mãe disse:
    — Está aí assim há meia hora, chorando que nem maluco. Não sei mais o que eu faço. Já lhe prometi tudo, mas ele continua berrando desse jeito.
    O pai examinou a situação e propôs:
    — Olha, Henriquinho. Se a tartaruga está morta, não adianta mesmo você chorar. Deixa ela aí e vem cá dentro com o pai.
    O garoto depôs cuidadosamente a tartaruga junto do tanque e seguiu o pai, pela mão. O pai sentou na poltrona, botou o garoto no colo e disse:
    — Eu sei que você sente a morte da tartaruguinha. Eu também gostava muito dela. Mas vamos fazer pra ela um grande funeral. (Empregou de propósito a palavra difícil).
    O menininho parou imediatamente de chorar.
    — O que é funeral?
    O pai lhe explicou que era um enterro.
    — Olha, nós vamos à rua, compramos uma caixa bem bonita, muitas balas, bombons, doces e voltamos para casa. Depois botamos a tartaruga na caixa em cima da mesa da cozinha e rodeamos de velas, cantamos “Parabéns pra você” para a tartaruguinha morta e você assopra as velas. Depois pegamos a caixa, abrimos um buraco no fundo do quintal, enterramos a tartaruguinha e botamos uma pedra em cima com o nome dela e o dia em que ela morreu.
    — Isso é que é funeral? Vamos fazer isso!
    O garotinho estava com outra cara.
    — Vamos, papai, vamos! A tartaruguinha vai ficar contente lá do céu, não vai? Olha, eu vou apanhá-la.
    Saiu correndo. Enquanto o pai se vestia, ouviu um grito no quintal.
    — Papai, vem cá, ela está viva!
    O pai correu pro quintal e constatou que era verdade. A tartaruga estava andando de novo, normalmente.
    — Ela está viva! - disse o pai – Não vamos ter que fazer o funeral!
    — Vamos, sim, papai! – disse o menino ansioso, pegando uma pedra bem grande – Eu mato ela!!!

FERNANDES, Millôr. Fábulas fabulosas. Rio de Janeiro: Nórdica, 1997.


QUESTÕES

1. Vocabulário: indique outro significado equivalente para os termos sublinhados no texto.
a) "ficou penalizada": 
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b) "não se conformava":
____________________________________________________
c) "depôs":
___________________________________________________
d) "vou apanhá-la":
_________________________________________________

2.A mãe gostava da tartaruga? Justifique, de acordo com o texto.
____________________________________________________________________

3. O menininho parece ser bem pequeno. Explique essa afirmação, com base (sem copiar!) em duas informações do texto.
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4. No 3º parágrafo, há o seguinte trecho: "A mãe lhe prometeu um carrinho, uma bicicleta, lhe prometeu uma surra". Por que a mãe começou prometendo brinquedos e terminou ameaçando castigo ao menino?
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5. Por que o menininho parou de chorar?
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6.  "— Papai, vem cá, ela está viva!". Nesse trecho, que sentimento, provavelmente, o leitor espera que o menino tenha?
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7. E como o menino ficou, ao constatar que a tartaruga estava viva? Por quê?
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8. Elabore um parágrafo, posicionando-se a respeito da atitude do menininho, em querer matar a tartaruga.
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terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

INTERPRETAÇÃO O COME E NÃO ENGORDA

O come e não engorda

Ninguém é mais admirado ou invejado do que o come e não engorda. Você o conhece. É o que come o dobro do que nós comemos e tem metade da circunferência e ainda se queixa:
– Não adianta. Não consigo engordar.
O come e não engorda é meu ídolo. Só não lhe peço autógrafo por inibição. Meu sonho é emagrecer e depois nunca mais engordar, por mais que tente. Quando eu diminuir, quero ser um come e não engorda.
Não se deve confundir o come e não engorda com o enfastiado. Este pertence a outra espécie. Não é humano. Pode até ser melhor do que nós, um aperfeiçoamento, mas não é humano. Afinal, o que une a humanidade é o seu apetite comum. Não é por nada que partilhar da comida com o próximo tem sido um símbolo de concórdia desde as primeiras cavernas. Até hoje as conferências de paz se fazem em volta de uma mesa onde a comida, se não está presente, está implícita. Desconfie do enfastiado. Ele será um agente de outra galáxia ou um poço de perversões, ou as duas coisas. De qualquer maneira, mantenha-o longe das crianças. Quando encontrar alguém na frente de um prato cheio emparelhando as ervilhas com a ponta da faca, notifique os órgãos de segurança. É um enfastiado e pode ser perigoso. Sempre achei que as pessoas que comem como um passarinho deviam ser caçadas a bodoque. O seu fastio, inclusive, é um escárnio aos que querem comer e não podem.
Já o come e não engorda compartilha do nosso apetite, só não compartilha das conseguências. Ele repete a massa e não tem remorso. Pede mais chantily e sua voz não treme. Molha o pão no café com leite! E ainda se queixa:
– Há 15 anos tenho o mesmo peso.
O come e não engorda só parou de mamar no peito porque proibiram sua mãe de ficar junto no quartel. Quando o come e não engorda nasceu, uma estrela misteriosa apareceu no Guide Michelin de restaurantes para aquele ano. O come e não engorda caminha sobre a sauce bernaise e não afunda. Multiplica os filés de paixe à meunière e os pães de queijo. Por onde o come e não engorda passa, as ovelhas se atiram para trás e pedem “me assa!”. O come e não engorda tem o segredo da Vida e da Morte e, suspeita-se, o telefone da Bruna Lombardi. E ainda se queixa:
 – Tenho que tomar quatro milk-shakes entre as refeições. Dieta.
Dieta! E você ali, de olho arregalado.

1)  Explique o significado da palavra ENFASTIADO de acordo com o texto:
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2) Qual o significado da expressão COME E NÃO ENGORDA
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3) O autor afirma que partilhar comida tem sido símbolo de concórdia desde o tempo das cavernas. O que ele quis dizer com isso?
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4) “ não lhe peço autógrafo por inibição.” Explique o motivo do acento na palavra em negrito.
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5) “Molha o pão no café com leite! E ainda se queixa:” Por que a palavra café foi acentuada e a palavra leite não?
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6) “Ninguém é mais admirado ou invejado do que o come e não engorda. Você o conhece. É o que come o dobro do que nós comemos e tem metade da circunferência e ainda se queixa:” Retire desse fragmento do texto três palavras que contenham DÍGRAFOS
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7) “Quando o come e não engorda nasceu, uma estrela misteriosa apareceu no guia  de restaurantes para aquele ano.” Retire desse fragmento três palavras que possuam mais letras do que fonemas.
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8) “Não é por nada que partilhar da comida com o próximo tem sido um símbolo de concórdia desde as primeiras cavernas.” Quais palavras desse fragmento são substantivos?
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9)  Ninguém é mais admirado ou invejado do que o come e não engorda. Você o conhece. É o que come o dobro do que nós comemos e tem metade da circunferência e ainda se queixa: Das palavras grifadas quais são adjetivos?

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10) Explique com suas palavras pelo menos três características que identificam um poema.

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domingo, 26 de fevereiro de 2017

O MENINO INTERPRETAÇÃO CEREJA 8º ANO

O menino

        Vou fazer um apelo. É o caso de um menino desaparecido. 
       Ele tem 11 anos, mas parece menos; pesa 30 quilos, mas parece menos; é brasileiro, mas parece menos. 
       É um menino normal, ou seja: subnutrido, desses milhares de meninos que não pediram pra nascer; ao contrário: nasceram pra pedir. 
       Calado demais pra sua idade, sofrido demais pra sua idade, com idade demais pra sua idade. É, como a maioria, um desses meninos de 11 anos que ainda não tiveram infância. 
       Parece ser menor carente, mas, se é, não sabe disso. Nunca esteve na Febem, portanto, não teve tempo de aprender a ser criança-problema. Anda descalço por amor à bola. 
       Suas roupas são de segunda mão, seus livros são de segunda mão e tem a desconfiança de que a sua própria história alguém já viveu antes. 
       Do amor não correspondido pela professora, descobriu que viver dói. Viveu cada verso de "Romeu e Julieta", sem nunca ter lido a história. 
       Foi Dom Quixote sem precisar de Cervantes e sabe, por intuição, que o mundo pode ser um inferno ou uma badalação, dependendo se ele é visto pelo Nelson Rodrigues ou pelo Gilberto Braga. 
       De seu, tinha uma árvore, um estilingue zero quilômetro e um pássaro preto que cantava no dedo e dormia em seu quarto. 
       Tímido até a ousadia, seus silêncios gritavam nos cantos da casa e seus prantos eram goteiras no telhado de sua alma. 
       Trajava, na ocasião em que desapareceu, uns olhos pretos muito assustados e eu não digo isso pra ser original: é que a primeira coisa que chama a atenção no menino são os grandes olhos, desproporcionais ao tamanho do rosto. 
       Mas usava calças curtas de caroá, suspensórios de elástico, camisa branca e um estranho boné que, embora seguro pelas orelhas, teimava em tombar pro nariz. 
       Foi visto pela última vez com uma pipa na mão, mas é de todo improvável que a pipa o tenha empinado. Se bem que, sonhador do jeito que ele é, não duvido nada.
       Sequestrado, não foi, porque é um menino que nasceu sem resgate. 
        Como vocês veem, é um menino comum, desses que desaparecem às dezenas todos os dias. 
       Mas se alguém souber de alguma notícia, me procure, por favor, porque... ou eu encontro de novo esse menino que um dia eu fui, ou eu não sei o que vai ser de mim. 

(Chico Anysio. Disponível em: http://oglobo.globo.com/cultura/um-autorretrato-inedito-de-chico-anysio-4428439. Acesso em: 27/6/2014.) 

Glossário:
Caroá: tecido rústico. 
Dom Quixote: personagem da obra do escritor espanhol Miguel de Cervantes, caracterizada como sonhadora e delirante. 
Febem: sigla de Fundação Estadual para o Bem-Estar do Menor; hoje, Fundação Casa (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente). 
Nelson Rodrigues: escritor e dramaturgo brasileiro. 
Gilberto Braga: autor de telenovelas brasileiro. 
Romeu e Julieta: peça teatral de William Shakespeare em que dois adolescentes são impedidos de viver o amor em razão da inimizade entre suas famílias. 

1. O texto é construído como se fosse um anúncio de busca de pessoa desaparecida. 
a) Em que trecho isso fica explícito? 
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b) Em geral, o que caracteriza um texto desse tipo? 
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2. No texto em estudo: 
a) Quais são as características do menino? 
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b) Como se trajava? Faça um levantamento do que o menino usava como vestuário. 
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c) O que fazia quando foi visto pela última vez? 
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d) Deduza: Qual era a condição social do menino? 
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3. O texto faz outras caracterizações do menino, além das físicas. 
a) Que elementos dizem respeito: 
·         - ao mundo infantil do menino? 
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·         - ao romantismo precoce?
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·         - à concepção do mundo? 
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b) Referindo-se ao menino, o narrador diz: "sonhador do jeito que ele é". Qual personagem citada no texto também é um sonhador? 
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4.Observe essas referências feitas ao menino; “é brasileiro”, “desses milhares de meninos”, “como a maioria”, “que desaparecem as dezenas”, “ sua própria história alguém já viveu antes”.
a) As palavras e expressões destacadas nesses trechos singularizam a figura do menino desaparecido, facilitando seu reconhecimento?
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b) Que efeito esse tipo de referência ao menino produz no leitor?
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5. O narrador também faz referências ao menino utilizando expressões como estas: "subnutrido", "nasceram pra pedir", "ainda não tiveram infância", "sem resgate". Que visão da infância se depreende desses trechos: feliz, bem-cuidada ou desprotegida e carente? 
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6.  Aos poucos, vai ficando claro o tema do texto e sua verdadeira intencionalidade.  
a) Qual é o tema do texto ?
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b) Apesar de o texto abordar um grave problema da realidade brasileira, ele não perde o humor. Explique como se constrói o humor nestes trechos: 

"pesa 30 quilos, mas parece menos; é brasileiro, mas parece menos" 
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"com idade demais pra sua idade" 
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"é de todo improvável que a pipa o tenha empinado"
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7. No último parágrafo há uma revelação importante para o desfecho do texto. 
a) Qual é a revelação? 
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b) Nesse sentido, o menino procurado se perdeu no espaço ou no tempo? Explique. 
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8. O narrador aponta todas as carências do menino que ele foi, mas, no final do texto, diz: "ou eu encontro de novo esse menino que um dia eu fui, ou eu não sei o que vai ser de mim". 
a) Interprete: Por que o narrador deseja encontrar o menino que ele foi? 
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b) O desaparecimento do menino deve ser visto como um fato concreto ou ele pode representar um desaparecimento no sentido figurado? Explique. 
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9. O texto "O menino" contém humor e lirismo. Contudo, além de provocar o riso e a emoção, ele também cumpre outra finalidade. Qual é ela?
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Gabarito:

1. 
a) “Vou fazer um apelo. É o caso de um menino desaparecido.”
b) A identificação da pessoa desaparecida, seguida da descrição dela, incluindo-se: vestuário e traços físicos e psicológicos. 

2.
a) Tem 11 anos, 30 quilos, é brasileiro, olhos pretos de tamanho desproporcional ao tamanho do rosto.
b) Estava descalço, usava roupas de segunda mão, calças curtas de caróa, suspensórios de elástico, camisa branca, boné. 
c) Tinha uma pipa na mão.
d) Era um menino pobre.

3.
a) 
árvore, estilingue, pássaro preto, pipa, bola.
o amor pela professora não correspondido.
a ideia de que o mundo pode ser um lugar de sofrimento ou um lugar de prazeres (inferno ou badalação). 

b) Dom quixote. 

4. a) não elas correspondem a informações genéricas que situam o menino em um grupo amplo, coletivo.
b) Produz um estranhamento inicial, seguido pelo reconhecimento de que a situação de um garoto (estar perdido sem família ou sem orientação) diz respeito a parte significativa da infância do país

5. Trata-se de uma visão de infância marcada pela carência, “desaparecida” tanto no espaço quanto na visão das autoridades e das famílias, responsáveis pelo bem-estar das crianças. 

6. 
a) O tema do texto é a pouca atenção que se dá á infância no Brasil, pois há no país grande número de crianças pobres, desnutridas, se escola e sem receber os cuidados necessários. 

b) 
- (Primeiro trecho) O paralelismo de termos quantificáveis (anos, quilos) é quebrado por um termo não quantificável: brasileiro.

-  (Segundo trecho) Não é possível alguém ter uma idade diferente da que tem na realidade.

- (Terceiro trecho) Inversão de expectativa: a ideia de a pipa empinar o menino, e não o inverso. 

7.
a) A de que o menino procurado é o menino que o narrador do texto foi um dia e que ele perdeu.
b) O menino se perdeu no tempo, mas ficou no passado do narrador.

8.
a) Sugerimos abrir uma discussão com a classe. Entre outras possibilidades, parece que a infância sofrida foi a base de tudo oque o narrador se tornou. Reencontrar-se com o passado é uma forma de reafirmar seus próprios caminhos e confirmar sua identidade. 
b) Ele pode representar um desaparecimento no sentido figurado, pois o menino pode ter desaparecido dentro do adulto que o narrador se tornou.


9. A finalidade de fazer uma crítica ao descaso com que as crianças são tratadas por certas famílias e pelas autoridades.