A HISTÓRIA DE CLARICE - ANNA CLAUDIA RAMOS
CAPÍTULO 1 - A MUDANÇA
Eram onze e meia da noite quando o telefone tocou. Luciana levou um susto e correu para atender. Uma voz estranha procurava por ela. Parecia aflita.
Não é possível!?! Como é que isso foi acontecer? E as crianças? Como estão? Como receberam a notícia?
As crianças estão muito assustadas. Ficaram horas sozinhas até eu descobrir e ir buscá-las. Clarice não fala nada. Está muda desde o acontecido. André chora muito, fica chamando pela mãe o tempo todo. Também, pudera, não é?, onde já se viu Andreia fazer uma coisa dessas...
Mas como é que ela teve coragem de fazer isso?
Pois é... não sei o que deu na cabeça da Andreia para fazer isso com as crianças! Mas sabe como é, desde que sua avó morreu as coisas não estavam bem por aqui. E só pioraram quando o Michel foi embora.
Eu sei, eu sei... Mas a senhora pode deixar que amanhã bem cedo eu tô aí. Eu só não desço agora porque tenho medo de pegar estrada à noite.
Não se preocupe, venha amanhã, com calma. Pegar essa estrada à noite é muito perigoso. Não vale a pena se arriscar. Ainda mais agora que as crianças vão precisar muito de você.
E assim, Luciana deixou sua casa na serra e desceu para o Rio de Janeiro numa quarta-feira quente e abafada. A primeira coisa que fez foi procurar Dona Cacilda, agradecer por ter ficado com seus sobrinhos e pedir que ficasse com eles durante o dia. Pelo menos enquanto ela resolvia os problemas e arrumava a papelada para tentar conseguir a guarda das crianças. Luciana imaginou que isso não seria tão complicado, já que Andreia havia deixado uma carta registrada em cartório pedindo que os filhos ficassem com a irmã, sua única parenta viva.
Nos últimos anos, as crianças tiveram pouco contato com a tia. Luciana e Andreia não se davam muito bem. Luciana chegou a acompanhar o crescimento da sobrinha até os seis anos, época em que André nasceu e ela se mudou de vez para uma cidade pequena.
O menino tinha visto a tia algumas vezes nesse meio tempo, principalmente nos aniversários da Bisa e nos Natais. Na verdade, a Bisa das crianças ainda era o único elo entre as irmãs. É que Andreia fazia questão de dizer que Luciana não tinha mais nada a ver com sua vida. Muito menos com a educação que ela dava para os filhos. E que se arrependia amargamente de ter deixado a irmã escolher o nome da filha.
Depois que a Bisa faleceu, elas se separaram completamente. Vez ou outra, quando ia ao Rio, Luciana ligava para Andreia, via os sobrinhos, mas tudo muito rápido, sem grandes afetos. Luciana morria de pena das crianças, mas não podia fazer muita coisa.
E, sendo assim, quando tia e sobrinhos se encontraram pela primeira vez desde o acontecido, foi tudo muito estranho. Todos estavam sem saber o que falar ou o que fazer. Então, Luciana abraçou as crianças, disse que tudo ia ficar bem, que eles não estavam mais sozinhos, que agora ela estava ali e que os levaria pra morar com ela, que eles não ficariam abandonados de jeito nenhum, mas teriam que se acostumar com uma nova vida, num sitio, cheio de plantas e bichos.
André, meio que chorando, abraçou bem apertado a tia. Luciana achou que morar num sítio seria muito bom para um menino de quase cinco anos. Talvez ajudasse a não pensar tanto na mãe. Clarice não esboçou nenhuma reação em relação ao sítio. Apenas falou:
— Ela não me abandonou. Eu já nasci abandonada. E se calou.
Luciana engoliu em seco aquela frase, afinal, sabia que tinha um fundo de verdade. Mas como era duro escutar essas palavras na boca de uma menina de apenas dez anos de idade. Luciana, ou tia Lu, como André começou a chamá-la, mal sabia que o silêncio de Clarice duraria muito tempo.
Enfim, após alguns dias, Luciana se despediu de Dona Cacilda e agradeceu pelo que ela tinha feito por seus sobrinhos. Depois colocou tudo que as crianças tinham na mala de seu carro e partiu rumo à serra.
Durante a viagem a tia tentou puxar conversa, contou que morava numa casa cheia de plantas e que tinha três cachorros: Ferrugem, Nata e Trovão. André quis saber por que os cachorros tinham esses nomes. Luciana explicou que Ferrugem ganhou este nome por conta de sua cor, que parecia enferrujada. Ele era bem esperto e adorava crianças. E que Nata chegou no sítio vindo não se sabe de onde. Era uma noite de chuva e Luciana acolheu a cadelinha. Naquela mesma noite descobriu que a cachorrinha adorava comer a nata do leite, então começou a chamá-la de Nata, mas o mais engraçado era que ela era uma cadela bem pretinha. Trovão também chegou num dia de chuva, tremia feito vara verde, como se diz lá na roça, e acabou ganhando esse nome porque morria de medo de chuvas e trovoadas. Todo mundo achava que ele se chamava Trovão porque era forte, mas que nada, ele tem medo de qualquer chuvinha. É só começar e chover que ele se esconde debaixo da mesa, da cama, de qual, quer lugar onde se sinta protegido.
E o Ferrugem, tia?
Gente o que é que tem o Ferrugem?
Como é que ele chegou no sítio?
Ah! o Ferrugem eu ganhei do meu amigo Fábio.
Depois Luciana contou que nos sítios vizinhos tinha muitas crianças e que lá era bem diferente da cidade grande, dava Pra correr solto, pra brincar sem medo, soltar pipa, tomar banho de rio, andar a cavalo no sítio do Seu Jeremias, que é bem pertinho.
André estava achando tudo uma beleza, perguntou se ia poder jogar bola no quintal, se ia poder brincar com os meninos, se ia ter escola, se poderia brincar com os cães. Luciana achou graça da euforia do menino, mas no fundo sabia que essa alegria era momentânea, que quando ele se lembrasse da mãe iria chorar e sentir muitas saudades. Pensou que nada seria muito fácil, principalmente para Clarice, que passou a viagem toda muda.
No fundo, Luciana sabia que não seria fácil para ninguém, nem para ela, que estava acostumada com uma vida calma e sem horários predeterminados, mas que de um dia para o outro acabou ganhando dois sobrinhos para cuidar.
Já estavam subindo a serra, quando se lembrou que teria que matricular as crianças na escola. Mas teria tempo. As férias mal tinham começado. Foi em meio a tantos pensamentos que Luciana foi interrompida por André.
Tia Lu, a Clarice podia ficar muda pra sempre.
— Que história é essa, André?
É, tia Lu, ela fica mais legal quando tá muda. Quando ela tava falando, ela me enchia o tempo todo. Ficava me mandando fazer um monte de coisa e brigava comigo toda hora. Ela não gosta de mim.
Ô, meu querido, o que é isso? A Clarice gosta de você sim, é que ela tá triste, e às vezes, quando a gente tá triste, a gente fica confusa. Daqui a pouco ela tá conversando outra vez e vai ficar tudo bem. Eu prometo.
Prefiro ela assim, tia Lu, sem falar nada.
Luciana olhou pelo espelho retrovisor e viu a cara fechada da menina, num misto entre emburrada e triste.
1. Qual o nome das personagens?
a) As crianças __________________________________________
b) A mãe das crianças_____________________________________
c) A tia das crianças_______________________________________
d) O pai das crianças que foi embora__________________________
2. Qual a idade das crianças:
a) Clarice ____________________
b) André ____________________
3. Por que Luciana não teria problemas para conseguir a guarda das crianças?
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4. Como era a relação entre as irmãs?
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5. Qual o nome dos cachorros de Luciana?
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6. Explique o motivo do nome de cada um dos cachorros.
a) Ferrugem
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b) Nata
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c) Trovão
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7. Onde morava cada uma das irmãs?
a) Luciana
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b) Andreia
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8. Por que André preferia a irmã muda?
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9. Como Clarice se sentia em relação à mãe?
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10. Como Andre estava imaginando que seria a nova vida?
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