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Conto ou não conto? Abel Sidney
-- Conta, vai,
conta!
-- Está bem!
Mas você promete não contar para mais ninguém?
-- Prometo.
Juro que não conto! Se eu contar quero morrer sequinha na mesma hora...
-- Não precisa
exagerar! O que vou contar não é nada assim tão sério. Não precisa jurar.
-- Está bem...
Depois de
muitos anos, ainda me lembro em detalhes sobre o que eu e minha prima
conversamos. Éramos muito pequenas e eu passava as férias em sua casa. Nunca
brincamos tanto, quanto naqueles dias!
Lembro-me do
segredo que ela prometeu me contar.
-- Olha, eu
vou contar, mas é segredo! Não conte para ninguém. Se você contar eu vou ficar
de mal.
-- Eu não vou contar, já disse!
O segredo não
era nada sério, coisa mesmo de criança naquela idade. E ela acabou contando...
-- Minha mãe
saiu para fazer compras e eu fiz um bolo. Eu quebrei dois ovos, misturei com a
farinha de trigo e o açúcar. Não deu nada certo. Com medo, eu arrumei tudo,
joguei o bolo fora e até hoje minha mãe não sabe de nada...
-- Meu Deus,
sua doida! Você teve coragem de fazer uma coisa dessas?!
-- Tive. Se a
minha mãe descobrir, eu não quero nem imaginar o que ela fará comigo!! Posso
ficar uma semana de castigo. Ou até mais...
A minha língua
coçou. Um segredo daqueles não poderia ficar guardado. Na primeira oportunidade
em que eu fiquei sozinha, procurei minha tia, que estava preparando o almoço.
-- Tia, preciso
contar uma coisa pra senhora.
-- Pois conte,
que estou ouvindo. Não posso te dar mais atenção, senão o almoço não sai...
-- É que eu
tenho um segredo pra te contar e não sei se devo...
-- O segredo é
seu ou dos outros?
-- Dos outros...
Quer dizer, da prima!
-- E por que
você quer contar os segredos alheios?
-- Bem, eu pensei que a senhora quisesse
saber o que aconteceu...
-- Ah, minha
filha, deixa eu te fazer apenas uma pergunta: a dona do segredo te autorizou a
contá-lo?
-- Na verdade,
não!
-- E por qual
motivo você me contaria, então?
-- É que...
Bem, o que ela fez não é muito certo...
-- E você vai
dedurar a sua prima? Se for alguma coisa muito grave ela ficará de castigo. E
você não terá com quem brincar. Você já pensou nisso?
-- Não...
-- Pois pense.
E depois volte aqui para conversarmos...
Eu não sabia
onde enfiar a cara, de tanta vergonha. E para que ninguém descobrisse os meus
pensamentos, me escondi na casinha do fundo do quintal. Na hora do almoço, saí
de lá, pois a fome, nessas horas, é uma sensata conselheira. E minha tia, com
muito cuidado, voltou a tratar do assunto.
-- Eu preciso
contar uma coisa pra vocês... Minha avó, quando eu era pequena, me ensinou uma
coisa que nunca mais me esqueci. E hoje, ouvindo uma notícia no rádio,
lembrei-me dela. Ela dizia que nós temos uma boca e dois ouvidos; por isso, nós
temos que mais ouvir do que falar. E mais: nem tudo o que ouvimos, devemos
passar adiante, pois quem conta um conto, aumenta um ponto. E se o que se conta
é um segredo, pior ainda. Por isso, nessas horas em que a nossa língua coça, o
melhor é lembrar que boca fechada não entra mosquito...
E contou
também histórias de outras gentes: mexeriqueiros, dedos-duros, fofoqueiros,
enfim, a turma do leva-e-traz...
Naquela tarde,
ainda preocupada que lessem os meus pensamentos, fiquei murchinha, daqui para
ali, inventando o que fazer...
Só no dia
seguinte, quando minha prima decidiu contar para mim outro dos seus segredos,
foi que eu tomei coragem de me sentar ao seu lado, bem quietinha. Disse ela:
-- Sabe, o
outro segredo é mais sério que o primeiro...
E fez suspense
– disse, repentinamente que estava com sede e foi buscar água na cozinha...
Depois de retornar, bebeu a água bem devagarinho, até recomeçar:
-- Olha, eu
tenho um grande defeito. Às vezes eu me escondo na cozinha, para ouvir a
conversa de minha mãe com as outras pessoas. E por acaso eu estava ontem,
tranquilamente sentada no meu cantinho secreto, quando alguém chegou para
conversar com ela. Como esta pessoa é minha conhecida (e eu gosto muito dela),
não posso contar o que aconteceu por lá... É uma pena! Eu só posso dizer que
essa pessoa é uma língua de trapo, uma linguaruda...
Nunca rimos tanto!
Eu, na
verdade, não sabia se me sentia agradecida ou envergonhada...
E passado
tantos anos, ainda hoje nós fazemos questão de relembrar este episódio.
Nossos filhos
compreendem, então, porque somos tão amigas e cúmplices. E olha que eles nem
imaginam o que ocorreu anos depois, quando éramos jovens e começamos a paquerar,
sem saber, o mesmo cara...
Bem, mas isto
é segredo e eu não posso contar!
ATIVIDADES
Imagine que você foi convidado a produzir uma tirinha baseada no texto “Conto ou não conto?”, de Abel Sidney. As cenas a seguir representam alguns episódios. Procure lembrar-se do percurso da história ou volte ao texto e recupere a sequência de fatos. Lembre-se de que os gêneros textuais se organizam de diferentes maneiras. Logo, para transformar um gênero textual em outro, é necessário fazer as devidas adequações de linguagem.
Entendendo o conto:
01 – O conto lido, inicia-se com um diálogo entre duas
personagens.
a) Quem são essas
personagens? Em que parágrafo elas se apresentam? Destaque no texto.
As personagens são a
narradora – protagonista e a prima. A identificação poder ser feita logo após o
diálogo que introduz a história: “Depois de muitos anos, ainda, me lembro em
detalhes sobre o que eu e minha prima conversamos”.
b) Logo no início do
texto, para resgatar lembranças, o narrador se manifesta em primeira ou em
terceira pessoa? Transcreva um trecho que ilustre sua resposta e destaque
palavras e expressões que comprovem o foco narrativo.
O narrador
manifesta-se em primeira pessoa, já que se apresenta também como
personagem-protagonista. Os recursos linguísticos que comprovam o foco
narrativo são, principalmente os pronomes e verbos na 1ª pessoa (singular
plural), por exemplo em: “Depois de muitos anos, ainda me lembro em detalhes
sobre o que eu e minha prima conversamos. Éramos muito pequenas e eu passava as
férias em sua casa. Nunca brincamos tanto, quanto naqueles dias!
Lembro-me do
segredo que ela prometeu me contar.”
02 – Observe a expressão “morrer sequinha”? Que sentidos
essa expressão pode ter no contexto do conto lido? E em outros contextos?
No texto, a expressão pode produzir o
sentido de punição, consequência dos atos: a personagem pode ficar sozinha,
isolada, aborrecida, deprimida; pode “definhar”, “pagar” pelos atos.
03 – Para contar uma história, em geral, situa as ações e os
acontecimentos no tempo e no espaço. Releia o texto, identifique e transcreva,
abaixo os marcadores temporais e os marcadores espaciais.
-- Marcadores temporais:
* Depois de muitos
anos.
* Naqueles dias.
* Quando eu era
pequena.
* Naquela tarde.
* Só no dia seguinte.
* Hoje.
-- Marcadores espaciais:
* (Férias) em sua
casa (da prima)
* Na casinha do fundo
do quintal (inferência) na cozinha da casa da tia.
04 – Durante o desenvolvimento da história, ocorreram várias
ações das personagens. Ao narrar essas ações, o enunciador as situa,
predominantemente. Cite uma frase.
a) No presente.
b) No pretérito.
c) No futuro.
“A minha língua coçou.”
Volte ao texto “Conto ou não conto?” - e proponha um final diferentepara ele. Continue a história a partir do seguinte ponto:
“[...]
E fez suspense – disse, repentinamente, que estava com sede
e foi buscar água na cozinha...”
Planeje o que e
como irá escrever. Escreva a primeira versão do texto e convide um colega para
fazerem a revisão textual. O que pode ser melhorado no texto? O que não pode
faltar no
texto para que haja coerência entre as ideias?
Avalie os resultados da produção.
Aspectos |
Sim |
Precisa Melhorar |
O final proposto apresenta as ideias de maneira clara, objetiva e coerente? |
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O leitor consegue compreender como a história terminou? |
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A linguagem é adequada ao gênero conto? |
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O texto apresenta escrita ortográfica adequada? |
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Os sinais de pontuação são utilizados adequadamente? |
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