Na Escola – Carlos Drummond de Andrade – 1978 - 70 historinhas.
Democrata é Dona Amarílis, professora na escola pública de uma rua que não vou contar, e mesmo o nome de Dona Amarílis é inventado, mas o caso aconteceu.
Ela se virou para os alunos, no começo da aula, e falou assim:
- Hoje eu preciso que vocês resolvam uma coisa muito importante. Pode ser?
- Pode – a garotada respondeu em coro.
- Muito bem. Será uma espécie de plebiscito. A palavra é complicada, mas a coisa é simples. Cada um dá sua opinião, a gente soma as opiniões e a maioria é que decide. Na hora de dar opinião, não falem todos de uma vez só, porque senão vai ser muito difícil eu saber o que é que cada um pensa. Está bem?
- Está – respondeu o coro, interessadíssimo.
- Ótimo. Então, vamos ao assunto. Surgiu um movimento para as professoras poderem usar calça comprida nas escolas. O governo disse que deixa, a diretora também, mas no meu caso eu não quero decidir por mim. O que se faz na sala de aula deve ser de acordo com os alunos. Para todos ficarem satisfeitos e um não dizer que não gostou.
Assim não tem problema. Bem, vou começar pelo Renato Carlos. Renato Carlos, você acha que sua professora deve ou não deve usar calça comprida na escola?
- Acho que não deve – respondeu, baixando os olhos.
- Por quê?
- Porque é melhor não usar.
- E por que é melhor não usar?
- Porque minissaia é muito mais bacana.
- Perfeito. Um voto contra. Marilena, me faz um favor, anote aí no seu caderno os votos contra. E você, Leonardo, por obséquio, anote os votos a favor, se houver. Agora quem vai responder é Inesita.
- Claro que deve, professora. Lá fora a senhora usa, por que vai deixar de usar aqui dentro?
- Mas aqui dentro é outro lugar.
-É a mesma coisa. A senhora tem uma roxo-cardeal que eu vi outro dia na rua, aquela é bárbara.
- Um a favor. E você, Aparecida?
- Posso ser sincera, professora?
- Pode, não. Deve.
- Eu, se fosse a senhora, não usava.
- Por quê?
- O quadril, sabe? Fica meio saliente…
- Obrigada, Aparecida. Você anotou, Marilena? Agora você, Edmundo.
- Eu acho que Aparecida não tem razão, professora. A senhora deve ficar muito bacana de calça comprida. O seu quadril é certinho.
- Meu quadril não está em votação, Edmundo. A calça sim. Você é contra ou a favor da calça?
- A favor 100%.
- Você, Peter?
- Pra mim tanto faz.
- Não tem preferência?
- Sei lá. Negócio de mulher eu não me meto, professora.
- Uma abstenção. Mônica, você fica encarregada de tomar nota dos votos iguais ao de Peter: nem contra nem a favor, antes pelo contrário.
Assim iam todos, votando, como se escolhessem o Presidente da República, tarefa que talvez, quem sabe? No futuro sejam chamados a desempenhar. Com a maior circunspeção. A vez de Rinalda:
- Ah, cada um na sua.
- Na sua, como?
- Eu na minha, a senhora na sua, cada um na dele, entende?
- Explique melhor.
- Negócio seguinte. Se a senhora quer vir de pantalona, venha. Eu quero vir de midi, de máxi, de short, venho. Uniforme é papo furado.
- Você foi além da pergunta, Rinalda. Então é a favor?
- Evidente. Cada um curtindo à vontade.
- Legal! – exclamou Jorgito. – Uniforme está superado, professora. A senhora vem de calça comprida, e a gente aparecemos de qualquer jeito.
- Não pode – refutou Gilberto. – Vira bagunça. Lá em casa ninguém anda de pijama ou
de camisa aberta na sala. A gente tem de respeitar o uniforme.
Respeita, não respeita, a discussão esquentou, Dona Amarílis pedia ordem, ordem, assim não é possível, mas os grupos se haviam extremado, falavam todos ao mesmo tempo, ninguém se fazia ouvir, pelo que, com quatro votos a favor de calça comprida, dois contra, e um tanto-faz, e antes que fosse decretada por maioria absoluta a abolição do uniforme escolar, a professora achou prudente declarar encerrado o plebiscito, e passou à lição de História do Brasil.
RESPONDA
1. De acordo com a explicação de Dona Amarílis, o que é plebiscito.
Cada um dá sua opinião, a gente soma as opiniões e a maioria é que decide.
2. Qual seria o ASSUNTO do plebiscito?
As professoras poderem usar calça comprida nas escolas.
3. Onde aconteceu a história.
Em uma escola.
4. De acordo com o nome das personagens e a linguagem utilizada por elas, a história se passa nos dias atuais ou há muitos anos? Justifique com palavras do texto.
Inesita, Rinalda, bacana, bárbara, obséquio...
5. Diga se o voto das personagens foi a favor ou contra e escreva o argumento que cada uma utilizou.
a) Renato Carlos. Contra, porque minissaia é muito mais bacana.
b) Inesita. A favor. Lá fora a senhora usa.
c) Aparecida. Contra. O quadril, sabe? Fica meio saliente...
d) Edmundo. A favor. A senhora deve ficar muito bacana de calça comprida.
e) Rinalda. A favor. Cada um curtindo a vontade.
f) Jorgito. A favor. Uniforme está superado.
g) Gilberto. Contra. Vira bagunça.
6. Substitua as palavras abaixo por sinônimos de acordo com o contexto.:
a) Plebiscito – votação.
b) Por obséquio – por favor
c) Saliente – destacado
d) Abolição – anulação
e) Em coro – todos juntos
f) Pantalona – calça comprida e larga
7. Ao fazer a uma votação sobre o uso ou não de calça jeans a professora estaria preparando os alunos para discutirem sobre quais possíveis temas no futuro?
Escolha de políticos,...
8. O assunto ou tema do texto é:
(a) o uso de calças nas escolas
(Xb) a diferença de opiniões
(c) a escola pública
(d) o plebiscito na escola
9. O assunto ou tema posto em debate por dona Amarílis é:
(Xa) o uso de calças nas escolas
(b) a diferença de opiniões
(c) a escola pública
(d) o plebiscito na escola
10. A duração da história é de aproximadamente;
a) um ano
b) um semestre
c) um bimestre
X d) uma aula
11. De acordo com o texto o uso de calças dependia
a) da realização de um plebiscito
X b) da autorização do governo de da diretora
c) da escolha dos alunos
d) da vontade da professora.
a) - Hoje eu preciso que vocês resolvam uma coisa muito importante.
b) A palavra é complicada, mas a coisa é simples.
X c) - Pode – a garotada respondeu em coro.
d) O que se faz na sala de aula deve ser de acordo com os alunos.
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