ATIVIDADES - O MENINO
QUE CAIU NO BURACO – CAPITULO I – BORBOLETA AZUL
FONTE DO TEXTO:
https://img.travessa.com.br/capitulo/EDICOES_SM/MENINO_QUE_CAIU_NO_BURACO_O-9788598457215.pdf
1.Por que o menino custou a sair da cama?
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2. O menino se sentia culpado ao comer, por quê?
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3. Qual a explicação médica para o fato de o pai do menino
ficar na cama?
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4. O menino não teria as duas primeiras aulas, por que mesmo
assim ele saiu cedo?
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5. O que ele encontrou no caminho?
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6. O menino conhecia o lugar, seu pai o levava lá para fazer
o quê?
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7. O pai do menino o
ensinou a voar de que maneira?
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8. O que a mãe do menino dizia para ele não entrar na antiga
fábrica?
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9. O que o menino viu quando estava na pequena clareira?
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10. Onde o menino
caiu?
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• Borboleta azul
O menino
acordou cedo para ir à aula. Muito cedo. O galo cacarejava nos fundos da casa.
Pela janela do quarto podia ver o sol despontando atrás das montanhas. O dia
prometia ser lindo, com o céu de inverno muito azul e quase sem nuvens, os
passarinhos cantando e o cheiro da cerca de eucaliptos que seu pai plantara
havia muito tempo.
O menino
tinha treze anos, mas já sabia que um dia bonito não queria dizer nada. Em dias
bonitos também aconteciam coisas ruins, porque a natureza não podia ficar prestando
atenção à vida das pessoas.
Custou a
sair da cama. Tinha a forte impressão de que nada de bom ia acontecer depois
que fizesse isso. Seria melhor continuar ali, afundando cada vez mais para
debaixo dos cobertores, com as pernas dobradas e as duas mãos entre elas,
naquele mundo quente, escuro e quieto.
O grito da
mãe o acordou de verdade. Pulou da cama, vestiu o uniforme do colégio às
pressas, pegou a mochila, que já estava arrumada, calçou os tênis ainda sujos
da lama das chuvas da semana anterior e correu para o banheiro.
Sua mãe já
colocara o copo de café com leite e os biscoitos em cima da mesa da cozinha.
Ela estava como sempre: os cabelos desgrenhados, as rugas profundas, os olhos
inchados de uma noite maldormida, vestindo aquele roupão ensebado amarrado na
cintura por um pedaço de corda de varal.
A mãe
apontou um pequeno embrulho sobre a mesa, dentro de um saco plástico. Era o
lanche. Ele o colocou dentro da mochila. Precisava dele. Passava quase o dia todo
fora e na escola não davam comida. Mas sentia-se culpado: cada pão, cada grão
de feijão, cada pedaço de carne que ele comia vinha do trabalho da mãe, lavando
e passando, de manhã até a noite, as roupas dos turistas que vinham se divertir
nos sítios do outro lado do rio.
O pai não
tinha ido embora, abandonado a família, se acabado com bebida, sumido no mundo,
nada disso. O pai do menino vivia lá no quarto, na cama. E não estava nem
doente do corpo.
Tinha sido
um marceneiro muito bom, com muitos clientes. Fazia móveis, prateleiras,
armários, escadas, sabia montar toda a armação de um telhado e chegou a fazer
um chalé inteiro de madeira. Conhecia o nome das árvores, tinha uma bolsa de
couro cheia de ferramentas bem tratadas, procurava deixar tudo perfeito e usava
uns óculos de lentes muito grossas, de tanto que se preocupava com os pequenos
detalhes.
Naquele
tempo o menino sentia muito orgulho do pai. Aos sábados, ia na garupa da
bicicleta, com a bolsa das ferramentas no colo, ajudar nos serviços. Todos
tratavam seu pai com muito respeito. Era um homem sério, que trabalhava calado
e em silêncio. Chegava a pedir que desligassem um rádio, por exemplo, porque
precisava “ouvir” a madeira. Quando alguém reclamava que assim, sem distração,
o trabalho pesava mais, ele dizia que era só questão de se acostumar.
— O silêncio
primeiro é um problema, depois uma solução — falava ele.
O menino
gostava muito das frases do pai.
Mas agora o
pai vivia na cama. Havia quase um ano. Ninguém sabia o que estava acontecendo.
Sem forças para trabalhar. Os médicos alegavam que ele não tinha nada, que se
quisesse poderia levantar e fazer as coisas, mas o problema era que ele não
queria. Depois de um longo período sem trabalho, ele simplesmente desistiu e
ficou no quarto.
O menino
lembrava de uma noite, quando o pai chegou da vila e sentou na cadeira da
varanda, olhando os vaga-lumes. Lembrava da mãe perguntando o que havia
acontecido, e o pai repetindo:
— Muito barulho. Muito barulho.
No dia
seguinte, não saiu da cama.
Tiveram de
vender as ferramentas melhores, para comprar comida.
Se alguém
entrasse no quarto e perguntasse o que estava sentindo, a resposta era sempre a
mesma:
— Estou
triste.
E depois o
silêncio.
Agora
ninguém falava mais sobre isso naquela casa.
O menino
botou a mochila nas costas e saiu sem dizer nada.
Havia muito
tempo que naquela casa ninguém gostava de falar, muito menos de sorrir.
O dia estava
mesmo bonito. O sol refletia no orvalho e o menino ia pisando pequenos arco-
-íris na grama rala do caminho. Havia uma única nuvem, muito branca, sobre as
montanhas, parecida com as bolas de algodão que ele tirava de dentro dos vidros
de remédio que davam para o seu pai, mas que não adiantavam nada.
A escola
ficava a três quilômetros de distância e ele normalmente levava uma meia hora
até lá, porém naquele dia estava sem pressa nenhuma. Não teria as duas
primeiras aulas. Podia até ter continuado na cama. Mas a verdade é que qualquer
coisa era melhor do que ficar em casa.
A primeira
parte do caminho eram duas faixas de barro paralelas que cortavam o mato ralo
de um pasto, feitas pelas rodas das charretes e dos carros de boi. Por ali se
chegava a uma estrada mais larga, de barro socado e cheia de buracos, em que às
vezes passava algum automóvel, porém o mais comum era o menino andar até a
escola sem cruzar com ninguém.
O pasto continuava do outro lado da
estrada, onde uma trilha estreita levava a uma fábrica de panelas de barro.
A fábrica já
não funcionava. Estava parada havia muitos anos. Diziam que o lugar era assombrado.
Vários bois e cavalos foram encontrados mortos no pasto em volta, com marcas de
garras afiadas no pescoço. Logo espalharam que por ali vivia um lobisomem e a
fábrica acabou abandonada.
O menino
costumava ir bem distraído. Seus pensamentos chegavam à escola mais cedo do que
ele… o dever de casa feito às pressas, uma lição mal decorada, a menina da
outra turma que ele queria que gostasse dele, a nota da prova de matemática…
nunca prestava atenção no caminho. Mas naquele dia, como estava mesmo sem
pressa, ia observando uma grande borboleta azul que o acompanhava.
A borboleta
não virou à direita, em direção à escola. Ela atravessou a estrada e o menino
achou uma boa ideia fazer o mesmo.
A escola só
abriria dali a umas duas horas. Podia dar um passeio. Aproveitar aquela manhã
ensolarada. Passaria pela antiga fábrica, atravessaria a pinguela sobre o
ribeirão e alcançaria a estrada, lá do outro lado. Uma hora de caminhada, no
máximo. E ele conhecia bem o lugar. Seu pai o levara por ali algumas vezes,
quando era criança, para pescar os cascudos que saíam de debaixo das pedras
depois das chuvas.
O menino
continuou em frente. A borboleta azul desapareceu logo depois.
Era o mesmo
pasto, mas agora não se via nem um só cavalo ou boi. Um bando de maritacas
passou voando, depois o silêncio voltou. O silêncio lembrava o seu pai.
Andou por
meia hora, até avistar as paredes caídas da velha fábrica de panelas de barro.
Haviam tirado as telhas, as portas e as janelas; os caibros apodreceram; o vento
derrubara os tijolos, que se desfaziam. Agora o mato crescia entre as ruínas e
a construção aos poucos voltava a ser terra.
A única
coisa que resistia ao tempo era o grande forno de barro, no centro do terreiro.
Parecia uma casa de cupins gigante, com uma pequena abertura na frente, como
uma gruta. Quando era pequeno, seu pai o colocou lá em cima e o fez pular em
seus braços. O menino custou muito a tomar coragem, mas por fim se jogou, de
braços abertos. Depois, disse para os amigos que seu pai o ensinara a voar.
Havia muito
tempo não passava por ali e resolveu olhar o forno, onde colocavam as panelas
para assar e endurecer o barro. Por dentro era muito largo, oco e escuro, ainda
preto de fuligem. Sua mãe não queria que ele passasse por ali e o assustava,
dizendo que o lobisomem dormia dentro daquele forno.
O menino
jogou uma pedra lá dentro. Ela quicou nas paredes de barro e o vazio produziu
um eco triste. Ouviu um barulho a suas costas e se virou. Viu alguma coisa se
mexer perto das ruínas da fábrica. Um bicho peludo saiu dos escombros e sumiu
no mato.
Devia ser um
gambá ou um gato. Foi ver mais de perto.
Contornou as
paredes desabadas e, mais adiante, voltou a ver o mato se mexer. O capim estava
alto, mas não resistiu à curiosidade e avançou alguns passos.
O bicho
continuava sempre a sua frente. Podia ver seus movimentos pelo mato,
afastando-se um pouco quando o menino o perseguia, parando quando ele parava.
Um pouco
adiante, abriu-se uma pequena clareira, com uma grama rala queimada de sol
sobre pequenos montes de terra revolvida. Ao lado, um galho partido, muito
comprido, ainda com algumas folhas, ressecadas.
O menino viu
o vulto do animal peludo passar atrás de uma goiabeira. Pareceu maior do que
havia imaginado. Talvez um cachorro. Ficou com medo, mas mesmo assim deu um
passo à frente.
A terra sob o
seu pé cedeu.
Ele esticou
os braços, tentando segurar alguma coisa, e arranhou as mãos. Os braços bateram
com força no barro duro, um pedaço de pau rasgou seu cotovelo esquerdo e os
dois pés desceram. O chão se abriu embaixo dele. Paredes de terra cresceram a
sua volta, o corpo girou, sentiu uma forte pancada na nuca, o peito ralou com
força no barro, as pernas rasparam em pedras enquanto caía. As mãos agarraram
um pedaço de raiz. O corpo parou por alguns segundos, pendurado. Gritou. Ouviu
o eco na escuridão. A raiz partiu-se, ele girou e bateu de costas no fundo do
buraco, com toda a força.