CRÔNICA – crono - tempo |
A FUGA - FERNANDO SABINO
Mal o pai colocou o papel na máquina, o menino
começou a empurrar uma cadeira pela sala, fazendo um barulho infernal.
-- Para com esse barulho, meu filho – falou,
sem se voltar.
Com três anos já sabia reagir como homem ao impacto
das grandes injustiças paternas: não estava fazendo barulho, estava só
empurrando uma cadeira.
-- Pois
então para de empurrar a cadeira.
-- Eu vou
embora - foi a resposta.
Distraído, o
pai não reparou que ele juntava ação às palavras, no ato de juntar do chão suas
coisinhas, enrolando-as num pedaço de pano. Era a sua bagagem: um caminhão de
plástico com apenas três rodas, um resto de biscoito, uma chave (onde diabo
meteram a chave da despensa – a mãe mais tarde irá dizer), metade de uma
tesourinha enferrujada, sua única arma para a grande aventura, um botão
amarrado num barbante.
A calma que
baixou então na sala era vagamente inquietante. De repente, o pai olhou ao
redor e não viu o menino. Deu com a porta da rua aberta, correu até o portão:
-- Viu um
menino saindo desta casa? – gritou para o operário que descansava diante da
obra do outro lado da rua, sentado no meio-fio.
-- Saiu agora
mesmo com uma trouxinha – informou ele.
Correu até a
esquina e teve tempo de vê-lo ao longe, caminhando cabisbaixo ao longo do muro.
A trouxa, arrastada no chão, iam deixando pelo caminho alguns de seus
pertences: o botão, o pedaço de biscoito e - saíra de casa prevenido - uma
moeda de 1 cruzeiro. Chamou-o, mas ele apertou o passinho, abriu a correr em
direção à Avenida, como disposto a atirar-se diante do ônibus que surgia a
distância.
-- Meu
filho, cuidado!
O ônibus deu
uma freada brusca, uma guinada para a esquerda, os pneus cantaram no asfalto. O
menino, assustado, arrepiou carreira. O pai precipitou-se e o arrebanhou com o
braço como a um animalzinho:
-- Que susto
você me passou, meu filho – e apertava-o contra o peito, comovido.
-- Deixa eu
descer, papai. Você está me machucando.
Irresoluto,
o pai pensava agora se não seria o caso de lhe dar umas palmadas:
--
Machucando, é? Fazer uma coisa dessas com seu pai.
-- Me larga.
Eu quero ir embora.
Trouxe-o
para casa e o largou novamente na sala – tendo antes o cuidado de fechar a
porta da rua e retirar a chave, como ele fizera com a da despensa.
-- Fique aí
quietinho, está ouvindo? Papai está trabalhando.
-- Fico, mas
vou empurrar esta cadeira. E o barulho recomeçou.
SABINO,
Fernando. A vitória da infância. São Paulo, Ática, 1995. p. 43.
Entendendo a crônica:
1. A linguagem coloquial ou
informal é a que geralmente usamos no dia a dia nas conversas com amigos e
familiares. A única alternativa que NÃO apresenta linguagem informal é:
a) “O menino, assustado, arrepiou
carreira.”
b) “fazendo um barulho infernal.”
c) “saíra de casa prevenido”
2. Marque a alternativa em que a
linguagem está empregada em SENTIDO FIGURADO.
a) “os pneus cantaram no asfalto.”
b) “Correu até a esquina”
c) “De repente, o pai olhou ao
redor e não viu o menino.”
3. Qual das alternativas abaixo
NÃO é uma característica do gênero crônica presente na crônica A Fuga?
a) Fala de um acontecimento
simples, comum.
b) É um texto subjetivo,
percebemos a posição do narrador
c) É um texto objetivo, o
narrador não expressa sua opinião.
4. A crônica A Fuga de Fernando Sabino
é um texto:
a) descritivo – descreve um fato.
b) narrativo – narra um episódio
do dia a dia.
c) dissertativo – defende um
posicionamento, uma opinião.
5. A finalidade da crônica lida
é:
a) provocar reflexões
b) informar um fato
c) convencer o interlocutor
GABARITO:
1C
2A
3B
4B
5A
BIBLIOGRAFIA:
SABINO,
Fernando. A vitória da infância. São Paulo, Ática, 1995. p. 43
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