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domingo, 11 de setembro de 2022

SER FILHO É PADECER NO PURGATÓRIO CONSUMISMO INTERPRETAÇÃO CRONICA 8º E 9º

 Ser filho é padecer no purgatório (Carlos Eduardo Novaes)

        - Psssiu, psssiu. - Eu? – virou-se Juvenal apontando para o próprio peito. - É. O senhor mesmo – confirmou o comerciante à porta da loja -, venha cá, por favor. 

        Juvenal aproximou-se. O comerciante inclinou-se sobre ele e como que lhe segredando algo perguntou:

        - O senhor tem mãe? - Tenho. - Gosta dela? - Gosto. 

        - Então é com o senhor mesmo que eu quero falar. Vamos entrar. Tenho aqui um presente especial para sua mãe. 

        - Tem mesmo? Mas por que o senhor não entrega a ela pessoalmente?

        - Porque ela é sua mãe, não é minha. O senhor é que deve entregar o presente. 

        - Está bem. Então o senhor me dá que eu dou pra ela. 

        - Dar, não – corrigiu o comerciante -, infelizmente não estamos em condições. As vendas só subiram 75%. Vou ter que lhe vender presente.     

         - Mas eu não estava pensando em comprar um presente agora para minha mãe. O aniversário dela é em novembro. 

         - Não é pelo aniversário. É pelo dia das mães. 

         - Dia das mães? – repetiu Juvenal sempre desligado. – Mães de quem? 

         - Mães de todos. É depois de amanhã, domingo. - É mesmo? E quem disse isso?

          - Bem... - Está na Bíblia? 

          - Não. Ele foi criado por nós, comerciantes, para permitir que vocês manifestem seu amor e carinho por suas mães. 

          - Puxa, vocês são tão legais. Eu não sabia que os comerciantes gostavam tanto da mãe da gente. 

          - Pois acredite. E olhe, vou lhe contar um segredo: nós gostamos mais da mãe de vocês do que da nossa. 

          - É mesmo? E por que assim? 

- Porque a nossa não deixa lucro. Pelo contrário. Todo ano no dia das mães sou obrigado a desfalcar a loja para presenteá-la. 

          - Ainda bem que só é um dia, hein? Se fosse, digamos um trimestre das mães, vocês estariam na maior miséria. O senhor dá presentes caros a sua mãe? 

          - Bem, pra falar a verdade, tem uns dez anos que eu não dou presente pra ela no dia das mães.

          - E ela não reclama? 

          - Reclamava, até o dia que lhe disse que o dia das mães que era jogada comercial e que para mim o dia dela era todos os dias. 

         - Também acho. 

         - Não. Você não pode achar – esbravejou o dono da loja -, eu posso porque sou comerciante. Você não, você é consumidor. Tem que comprar um presente pra ela no dia das mães. 

         - Bem, já que é assim, então vamos ver o presente. 

        - Ótimo, assim é que se fala. Você tinha me dito que gostava de sua mãe, não é verdade? Gosta muito?

       - Muito. Por quê? - Porque nós temos aqui presentes para todos os gostos. Para quem gosta muito, para quem gosta pouco, para quem ainda está em dúvida. 

         - E o senhor dá desconto para quem gosta muito? 

         - Não. Nós só damos descontos para quem tiver mais de uma mãe. Fazemos, porém, um preço especial para juiz de futebol, que tem a mãe muito sacrificada. O senhor é juiz de futebol? 

          - Não. Sou bandeirinha – mentiu Juvenal. 

          - O senhor já foi xingado em campo alguma vez? 

          - Umas três. 

           - É pouco, só damos descontos para bandeirinhas que tenham sido xingados mais de cinco vezes. Vamos ver os presentes? Pra escolhermos o tipo de presente mais adequado eu preciso saber como é sua mãe. 

         - Mamãe? É uma mãe igual a qualquer outra. Não tem nada de especial. Ou melhor, de especial só tem o filho.

        - Vejamos. Quando o senhor era garoto ela costumava dizer: “Saia agasalhado meu filho”, “não vá comer agora que o jantar já vai pra mesa”, “não ande no ladrilho descalço”, “não abra a geladeira sem camisa”, “não se esfalfe”, “não chegue tarde”, “não apanhe chuva”, costumava? Costumava dizer que o senhor estava comendo pouco e lhe entulhava de remédios? 

       - Exatamente – surpreendeu-se Juvenal -, parece até que o senhor foi filho da minha mãe. 

       - Ou o senhor foi filho da minha. Se ela era realmente assim, o melhor presente é esta TV em cores.

       - Mas é o artigo mais caro que tem na loja. Não posso da aquela que é mais barata? 

        - Que é isso, meu senhor? Sua mãe merece o melhor. 

        - Mas eu não tenho dinheiro. Não posso dar o melhor. 

        - Que absurdo – indignou-se o comerciante -, se o senhor não pode dar o melhor para sua mãe vai dar a quem? Será que sua mãe não merece um sacrificiozinho de sua parte? 

       - Claro. Claro que merece. 

        - E, então? Pense nos sacrifícios que ela já fez pelo senhor. 

         - Estou pensando. - Então pense que eu espero. Ela fez muitos? 

         - Muitos o quê? 

         - Sacrifícios. 

          - Não estou pensando nos sacrifícios. Estou pensando no preço. Juvenal perguntou se podia ver outros artigos, talvez encontrasse algo mais em conta. “Posso mexer nas mercadorias da loja?”

         - Lógico – disse o comerciante – esteja à vontade. Pode remexer o quanto quiser. Aqui vale tudo. Só não vale xingar a mãe. 

       Juvenal saiu percorrendo a loja, com o comerciante atrás, matraqueando no seu ouvido sua técnica de vendedor: “O senhor sabe o que é ser mãe? Ser mãe como dizia Coelho Neto, é andar chorando num sorriso/ ser mãe é ter um mundo e não ter nada/ ser mãe é padecer num paraíso/ ser mãe é ter filho que lhe compre uma TV em cores ou um ar-condicionado ou uma geladeira, um secador de cabelos, uma cinta, um jogo de estofados, uma mobília de quarto...” 

      - Mobília de quarto?

        - E por que não? Armário, penteadeira, mesinha de cabeceira de cama. [...] 

       - Já resolvi – respondeu Juvenal decidido. – Não vou dar nada. 

       - O quê? – vociferou o comerciante. – O senhor não vai dar nada para aquela que lhe deu tudo? 

      - Vou lhe dar um beijo. 

       - Um beijo? O senhor tem coragem? O senhor é realmente um filho desnaturado. Em pleno século XX, em plena sociedade de consumo, o senhor vai chegar em casa de sua mãe e com a maior cara de pau lhe dar um beijo? Um beijo? Que espécie de filho é o senhor? Um beijo?

        - Bem, talvez dois ou três. 

           - Então leve ao menos esta pasta de dentes aqui. Contém genitol e mantém o hálito puro na hora de beijar sua mãe. 


1. O texto retrata uma situação em que um comerciante tenta vender ao cliente um presente para o Dia das Mães. Como você caracteriza a abordagem do vendedor: ela é agressiva (não respeita os limites) ou moderada (ele foi educado)? Explique. 


2. Para conseguir realizar a venda, o comerciante precisa persuadir o cliente, isto é, convencê-lo a comprar o produto. Para isso, utiliza alguns argumentos. Qual é o primeiro argumento apresentado pelo vendedor para atrair o cliente e levá-lo para dentro da loja? 


3. Questionado sobre a origem do Dia das Mães, o vendedor afirma que esse dia foi criado pelos comerciantes: 

a) Segundo a versão dos comerciantes, com que finalidade esse dia foi criado? 


b) Mas, para você, qual é a verdadeira finalidade da criação desse dia? 


c) Que fala do vendedor revela que ele tem consciência da finalidade comercial (só para vender) desse dia? Copie esse trecho para seu caderno. 


d) O vendedor afirma que os comerciantes gostam mais da mãe dos clientes do que da própria mãe. Por quê? Que explicação é dada pelo vendedor? 


e) O vendedor quer fazer uma sugestão de presente ao cliente. Contudo, antes de apresentá-la, “prepara o terreno” perguntando-lhe se, durante a infância, a mãe lhe dizia frases como “Saia agasalhado”, “não apanhe chuva”, entre outras. Qual era a intenção do vendedor ao citar frases como essas ao cliente? 

e) O vendedor sugeriu ao cliente, como presente para a mãe, uma TV em cores. O cliente achou essa TV muito cara e queria optar por uma mais barata. Cite dois argumentos utilizados pelo vendedor para convencer o cliente a comprar a TV mais cara. Procure-os no texto. 


f) No final da história, o vendedor se dá por vencido e desiste da venda? Explique. 


4.  A finalidade desse texto é... 

( ) descrever personagens. 

( ) realizar um anúncio. 

( ) narrar e fazer refletir sobre um fato. 

( ) apenas divertir o leitor. 

 

5. Releia: “Fazemos, porém, um preço especial para juiz de futebol, que tem a mãe muito sacrificada.”Que fato pode ter influenciado o comentário feito por este vendedor? 

( ) Porque juiz de futebol dá muito trabalho à mãe. 

( ) Porque juiz de futebol dá pouco valor à mãe dele. 

( ) Porque juiz de futebol é xingado em campo com frases que ofendem a mãe dele. 

( ) Porque juiz de futebol deixa a mãe nervosa durante os jogos. 

 

6.  “Ser filho é padecer no purgatório” é um texto que pertence ao gênero: 

( ) fábula, devido às situações fictícias criadas pelo autor e pela moral da história narrada. 

( ) crônica, pois nos faz refletir sobre fatos da realidade e atitudes das pessoas que nos cercam. 

( ) memória literária, pois aborda acontecimentos e lembranças passado, narrados de forma muito subjetiva e poética. 

( ) artigo de opinião, pois tem por objetivo convencer o leitor sobre um determinado ponto de vista, fazendo com que o leitor aceite a opinião apresentada. 

 

7.  Com que objetivo o autor teria produzido este texto? 

( ) Com o objetivo de nos fazer rir e, ao mesmo tempo, refletir sobre situações em que nos tornamos vítimas da sanha de comerciantes e de propagandas que fazem os mais variados tipos de chantagem. 

( ) Com o objetivo de nos fazer rir e, ao mesmo tempo, apresentar a reação dos clientes na busca de um presente. 

( ) Com o objetivo de despertar o desejo de consumo na população e, ao mesmo tempo, provar que é impossível sobreviver sem o consumo exagerado de produtos. 

( ) Com o objetivo de informar ao leitor a rotina diária de um comerciante, expondo sua difícil tarefa. 

 

8.  Um dos recursos mais utilizados para produzir humor, é a quebra da expectativa, o final inesperado. Que afirmação corresponde ao final inesperado neste texto? 


( ) Esperava-se que o comerciante fosse xingar o cliente, já que seu objetivo era vender. 

( ) Esperava-se que o comerciante não oferecesse nada mais ao cliente, mas ele ainda oferece um produto a fim de realizar a todo custo uma venda. 

( ) Esperava-se que o comerciante conseguisse vender outra TV, mas o cliente desiste. 

( ) Esperava-se que o comerciante desse um presente para a mãe do cliente. 

Professores de Língua Portuguesa 


ADAPTADO DE: Rede Municipal de Ensino de Morro da Fumaça - SC


PARTE II

Entendendo o texto: FONTE ARMAZEM DO TEXTO

Lido o texto, responda às questões a seguir, assinalando a única opção correta: –

01 – O comerciante perguntou se Juvenal gostava de sua mãe porque queria:

a. (   ) deixá-lo emocionado.           b. (   ) expor seus sentimentos

c. (X) vender-lhe um presente.       d. (   ) saber se ele era um bom filho.

 

02 – Com esse texto, o autor pretendeu demonstrar que:

a. (   ) merece purgatório quem esquecer o Dias das Mães.

b. (X) o comércio se importa apenas com o lucro das vendas.

c. (   ) o amor filial se torna mais evidente no Dias das Mães.

d. (   ) um único dia no ano é pouco para homenagear as mães.

 

03 – Em que dia da semana o comerciante conversou com Juvenal?

a. (   ) segunda-feira                b. (   ) domingo             

c. (X) sexta-feira                      d. (   ) quarta-feira.

 

04 – Em: “… sou obrigado a desfalcar a loja…”, a palavra em    destaque pode ser substituída por:

a. (X) diminuir      b. (   ) desperdiçar      c. (   ) furtar.

 

05 – Por que Juvenal pareceu surpreso quando o comerciante se referiu ao Dias das Mães?

      Porque Juvenal era desligado.

 

06 – Pelo que se lê no texto, Juvenal costumava presentear sua mãe? Justifique sua resposta.

      O texto deixa supor que ele só presenteava no dia do seu aniversário.

 

07 – O comerciante afirma que gosta mais das mães dos outros que da sua. Por quê?

      Porque, segundo o comerciante, as mães dos outros dão lucro para a loja e a dele dá prejuízo.

 

08 – No trecho abaixo, as palavras em negrito podem ter sido empregadas de maneira imprópria. Corrija o emprego, trocando-as para o lugar certo:

        Quando tentei confirmar meu amor pela Ingrácia, ela não me segredou que falasse e até demonstrou no meu ouvido que aquele momento era impróprio. Eu ainda tentei permitir, dizendo que todo momento era próprio, mas ela manifestou o que dissera e corrigiu certo desagrado pela minha insistência.

        Quando tentei manifestar meu amor pela Ingrácia, ela não me permitiu que falasse e até segredou no meu ouvido que aquele momento era impróprio. Eu ainda tentei corrigir dizendo que todo momento era próprio, mas ela confirmou o que dissera e demonstrou certo desagrado pela minha insistência.

 


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