PERDEDOR VENCEDOR
O perdedor
cumprimentou o vencedor. Apertaram-se as mãos por cima da rede. Depois foram ao
vestiário. Enquanto tiravam a roupa, o perdedor apontou para a raquete do outro
e comentou, sorrindo:
- Também, com
essa raquete...
Era uma
raquete importada, último tipo. Muito melhor do que a do perdedor. O vencedor
sorriu, mas não disse nada. Começou a descalçar os tênis. O perdedor comentou,
ainda sorrindo:
- Também, com
esses tênis...
O vencedor
quieto. Também sorrindo. Os dois ficaram nus e entraram no chuveiro. O perdedor
examinou o vencedor e comentou:
- Também, com
esse físico...
O vencedor
perdeu a paciência.
- Olha aqui -
disse. - Você poderia ter um físico igual ao meu, se se cuidasse. Se perdesse
essa barriga. Você tem dinheiro, senão não seria sócio deste clube. Pode
comprar uma raquete igual à minha e tênis melhores que os meus. Mas sabe de uma
coisa? Não é equipamento que ganha jogo. É a pessoa. É a aplicação, a vontade
de vencer, a atitude. E você não tem uma atitude de vencedor. Prefere atribuir
a derrota à minha raquete, aos meus tênis, ao meu físico, a tudo menos a você
mesmo. Se parasse de admirar tudo que é meu e mudasse de atitude, você também
seria um vencedor, apesar dessa barriga.
O perdedor
ficou em silêncio por alguns segundos, depois disse:
- Também, com
essa linha de raciocínio...
Perdedor, vencedor (Luís Fernando Veríssimo)
1. A crônica retrata uma situação comum, cotidiana, na qual
dois jogadores, ao final de uma partida de tênis, conversam.
a) Como é o espaço em
que eles estão?
b) Em quanto tempo se passa a história?
c) Como são retratados os personagens: de modo mais ligeiro
ou de modo mais aprofundado?
d) Como você caracterizaria cada um dos personagens? O que
possibilita chegar a essa conclusão?
2. Observe as falas do narrador. Que papel elas têm?
3. Observe as falas dos personagens.
a) Como elas são reproduzidas: em discurso direto ou em
discurso indireto?
b) Imagine como ficaria a crônica caso as falas dos
personagens fossem reproduzidas no outro tipo de discurso. Conclua: Que
vantagens, para a narrativa, resultam do tipo de discurso utilizado para
reproduzir as falas dos personagens?
4. Releia este trecho da crônica
“A pátria de ponteiros”, de Antonio Prata: “Mas e quando o
pessoa diz ‘tô saindo!’?” Expliquei que as declarações do brasileiro, no que
tange ao atraso, estão sempre uma etapa à frente da realidade — são uma manifestação
do seu desejo. Se a pessoa diz que está chegando, é porque tá saindo, e se diz
que tá saindo, é porque ainda precisa tomar banho, tirar a roupa da máquina e
botar comida pro cachorro.
a) Nesse trecho e em todo o texto, predomina o discurso direto
ou o discurso indireto?
b) Levante hipóteses: Considerando a finalidade e o estilo do
autor, por que predomina esse tipo de discurso?
c) Que papel desempenha no texto o outro tipo de discurso?
5. A passagem de um tipo de discurso para outro exige um conjunto
de modificações gramaticais que devem ser observadas. Junte-se a um colega, e,
em dupla, passem para o discurso direto o seguinte trecho do parágrafo inicial
da crônica de Antonio Prata.
Numa demonstração de abertura e inequívoca coragem, Fritz
pediu uma feijoada. Eu comentei que, aparentemente, ele não estava tendo
dificuldades de adaptação. O alemão disse que não. Por conta do seu trabalho
[...] viajava o mundo todo. A única coisa que lhe incomodava, no Brasil, era
nunca saber quando as pessoas chegariam aos encontros.
GABARITO
1.
a) Um vestiário de um clube
b) Poucos minutos.
c) São retratados de modo mais ligeiro.
d) d) O perdedor é o tipo de pessoa que não aceita as próprias limitações e sempre procura encontrar desculpas para elas; o ganhador é objetivo e direto. É possível chegar a essas conclusões por meio do diálogo entre os personagens.
2. As falas do narrador são breves e têm o papel de
contextualizar a situação inicial do diálogo, de descrever brevemente a raquete
e, depois, a reação dos interlocutores. Assim, elas “costuram” as situações,
uma vez que a narrativa se desenrola com base no diálogo entre os personagens
3.
a) Em discurso direto.
b) A crônica provavelmente perderia a graça caso o diálogo fosse reproduzido pelo discurso indireto. O discurso direto dá maior dinamismo, vivacidade e veracidade para a cena, proporcionando, assim, mais facilmente o efeito de humor pretendido pelo autor.
4.
a) Predomina o discurso indireto.
b) O humor do texto é construído a partir das reflexões do narrador a respeito dos hábitos do brasileiro diante da lógica do alemão, e não a partir dos diálogos.
c) O discurso direto é utilizado para reproduzir
principalmente as falas do alemão. Ele contribui para construir o humor do texto,
seja pelas características linguísticas da fala do personagem, seja pelo
espanto que este demonstra diante dos comentários do narrador.
5. — Uma feijoada —, pediu Fritz, numa demonstração de
abertura e inequívoca coragem. — Você não está tendo dificuldades de adaptação,
parece — comentei. — Não, disse Fritz. — Por conta do meu trabalho, viajo o
mundo todo. A única coisa que me incomoda, no Brasil, é nunca saber quando as
pessoas chegarão aos encontros.
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