TEXTO 1. Uma
Vela para Dario - Dalton Trevisan
https://www.youtube.com/watch?v=1kcvUrpqJsM
Dario vinha apressado, guarda-chuva no braço
esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminuiu o passo até parar,
encostando-se à parede de uma casa. Por ela escorregando, sentou-se na calçada,
ainda úmida de chuva, e descansou na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes
rodearam-no e indagaram se não se sentia bem. Dario abriu a boca, moveu os
lábios, não se ouviu resposta. O senhor gordo, de branco, sugeriu que devia
sofrer de ataque. Ele reclinou-se mais um pouco, estendido agora na calçada, e
o cachimbo tinha apagado.
O rapaz de bigode pediu aos outros que se
afastassem e o deixassem respirar. Abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e
a cinta. Quando lhe retiraram os sapatos, Dario roncou feio e bolhas de espuma
surgiram no canto da boca.
Cada pessoa que chegava erguia-se na ponta
dos pés, embora não o pudesse ver. Os moradores da rua conversavam de uma porta
à outra, as crianças foram despertadas e de pijama acudiram à janela.
O senhor gordo repetia que Dario sentara-se
na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na
parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao seu lado.
A velhinha de cabeça grisalha gritou que ele
estava morrendo. Um grupo o arrastou para o táxi da esquina. Já no carro a
metade do corpo, protestou o motorista: quem pagaria a corrida? Concordaram
chamar a ambulância. Dario conduzido de volta e recostado á parede - não tinha
os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém
informou da farmácia na outra rua. Não carregaram Dario além da esquina; a
farmácia no fim do quarteirão e, além do mais, muito pesado. Foi largado na
porta de uma peixaria. Enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse um
gesto para espantá-las.
Ocupado o café próximo pelas pessoas que
vieram apreciar o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozavam as delicias da
noite. Dario ficou torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio
de pulso.
Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os
papéis, retirados - com vários objetos - de seus bolsos e alinhados sobre a
camisa branca. Ficaram sabendo do nome, idade; sinal de nascença. O endereço na
carteira era de outra cidade.
Registrou-se correria de mais de duzentos
curiosos que, a essa hora, ocupavam toda a rua e as calçadas: era a polícia. O
carro negro investiu a multidão. Várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario,
que foi pisoteado dezessete vezes. O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde
identificá-lo — os bolsos vazios. Restava a aliança de ouro na mão esquerda,
que ele próprio quando vivo - só podia destacar umedecida com sabonete.
Ficou decidido que o caso era com o rabecão.
A última boca repetiu — Ele morreu, ele morreu. A gente começou a se dispersar. Dario levara
duas horas para morrer, ninguém acreditou que estivesse no fim. Agora, aos que
podiam vê-lo, tinha todo o ar de um defunto. Um senhor piedoso despiu o paletó
de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não pôde
fechar os olhos nem a boca, onde a espuma tinha desaparecido. Apenas um homem
morto e a multidão se espalhou, as mesas do café ficaram vazias. Na janela
alguns moradores com almofadas para descansar os cotovelos. Um menino de cor e
descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há
muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva. Fecharam-se uma
a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario à espera do rabecão. A
cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança.
A vela tinha queimado até a
metade e apagou-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.
Texto
extraído do livro "Vinte Contos Menores", Editora Record – Rio de
Janeiro, 1979, pág. 20
1.
Por que as pessoas concordaram em chamar a ambulância?
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2.
Escreva na ordem em que aparecem no texto os objetos que foram furtados de Dario.
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3.
O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo — os bolsos vazios.
De acordo com a leitura do texto, por que a polícia não conseguiu identificar
Dario?
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4.
“Cada pessoa que chegava erguia-se na ponta dos pés, embora não o pudesse ver”
Por que as pessoas que chagavam não conseguiam ver o que acontecia com Dario?
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5.
Se as pessoas quisessem realmente fazer algo para socorrer Dário poderiam ter
feito. Retire do texto um fragmento que indique que elas tiveram tempo para
isso.
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6.
Que pessoa praticou um ato de solidariedade e ajudou Dario. Justifique.
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7.
De acordo com o texto qual o motivo de as pessoas quererem chegar perto de Dario?
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8.
Indique uma das hipóteses levantadas sobre o que estava acontecendo com Dario?
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9.
Justifique com fragmentos do texto que todo tipo de pessoa se mostrou curiosa.
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10.
Qual o assunto abordado no texto?
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1.
O autor do texto pretende chamar a atenção PRINCIPALMENTE para:
a)
a indiferença das pessoas.
b)
a sensibilidade das crianças
c)
a imprevisibilidade da morte.
d)
os furtos dos objetos de Dario.
2.
“Dario levara duas horas para morrer” De acordo com esse fragmento o autor do
texto quer mostrar que Dario não foi socorrido por:
a)
falta de tempo.
b)
falta de sensibilidade
c)
falta de dinheiro
d)
falta de recursos.
3.
Assinale a alternativa que comprova o descaso das pessoas diante da situação de
Dario.
a)
“O senhor gordo, de branco, sugeriu que devia sofrer de ataque.”
b)
“A velhinha de cabeça grisalha grita que ele está morrendo.”
c)
“Já no carro a metade do corpo, protesta o motorista: quem pagaria a corrida?”
d)
“Um terceiro sugere lhe examinem os papéis, retirados - com vários objetos”.
4.
Apenas um homem morto e a
multidão se espalha, as mesas do café ficam vazias.” O emprego do vocábulo “Apenas” sugere, em relação ao
homem morto:
a)
irrelevância
b)
remorso
c)
piedade
d)
revolta.
5.
No texto, várias passagens confirmam a ideia de espetacularização da morte,
exceto em:
a)
“mais de duzentos curiosos que, a essa hora, ocupava toda a rua e as
calçadas...”
b)
“As mesas de um café próximo foram ocupadas pelas pessoas”
c)
“Cada pessoa que chegava erguia-se na ponta dos pés, embora não o pudesse ver.”
d)
“Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do
cadáver.”
6.
Um gesto de solidariedade está na passagem:
a)
“Um senhor gordo, de branco, sugeriu que devia sofrer de ataque.”
b)
“Uma velhinha de cabeça grisalha gritou que ele estava morrendo.”
c)
“Um rapaz de bigode pediu ao grupo que se afastasse e o deixasse respirar.”
d)
“Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça.
7.
A reunião de diferentes tipos de pessoas a observar os acontecimentos em torno
da morte de
Dário
pode levar o leitor a concluir que as pessoas, em geral, são
a)
curiosas.
b)
maldosas.
c)
indiferentes.
d)
interesseiras.
8.
“Por ela escorregando, sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva” O pronome
ELA se refere a:
a)
escada
b)
parede
c)
chuva
d)
casa
9.
A alternativa que apresenta um verbo em sentido conotativo, ou seja, figurado é:
a)
assim que dobrou a esquina
b)
Ele reclinou-se mais um pouco
c)
sentou-se na calçada
d)
Dario abriu a boca
10.
Esse conto foi publicado em 1979 e aborda a indiferença das pessoas em relação
ao seu próximo. Comparando com a atualidade podemos dizer que o tema está:
a)
ultrapassado
b)
anacrônico
c)
contemporâneo
d)
arcaico
PERGUNTAS
SOBRE O GÊNERO TEXTUAL
1.
Onde ocorrem os fatos narrados?
2.
Quando ocorrem?
3.
Quem é Dario? Descreva esse personagem.
4.
Quem são os demais personagens da narrativa?
5.
Qual é o foco narrativo do conto lido 1ª pessoa ou 3ª pessoa? Justifique.
GRAMÁTICA
1. “Cada pessoa
que chegava erguia-se na ponta dos pés, embora
não o pudesse ver.”, a única alternativa que NÃO possui uma conjunção com o
mesmo sentido de EMBORA é
a) ainda que
b) apesar de que
c) para que
d) mesmo que
2. “Dario vinha apressado, guarda-chuva no braço
esquerdo e, assim que dobrou
a esquina” A conjunção destacada indica relação de :
a) causa
b) tempo
c) fim
d) condição
3. “Quando
lhe retiraram os sapatos, Dario roncou feio e bolhas de espuma surgiram no
canto da boca.” Todas as conjunções abaixo fazem parte do grupo da conjunção
QUANDO exceto:
a) enquanto
b) assim que
c) depois que
d) porque