A CARTA DE AMOR
No momento em que Malvina ia por a frigideira no fogo, entrou a cozinheira com
um envelope na mão. Isso bastou para que ela se tornasse nervosa. Seu coração
pôs-se a bater precipitadamente e seu rosto se afogueou. Abriu-o com gesto
decisivo e extraiu um papel verde-mar, sobre o qual se liam, em caracteres
enérgicos, masculinos, estas palavras: “Você
será amada…”.
Malvina empalideceu, apesar de já
conhecer o conteúdo dessa carta verde-mar, que recebia todos os dias, havia já
uma semana. Malvina estava apaixonada por um ente invisível, por um papel
verde-mar, por três palavras e três pontos de reticências. “Você será amada…”. Há uma semana que vivia como ébria.
Olhava para a rua, e qualquer olhar de homem que se cruzasse com o seu, lhe
fazia palpitar tumultuosamente o coração. Se o telefone tilintava, seu
pensamento corria célere: talvez fosse “ele”. Se não conhecesse a causa desse
transtorno, por certo Malvina já teria ido consultar um médico de doenças
nervosas. Mandara examinar por um grafólogo a letra dessa carta. Fora em todas
as papelarias à procura desse papel verde-mar e, inconscientemente, fora até ao
correio ver se descobria o remetente no ato de atirar o envelope na caixa.
Tudo em vão. Quem escrevia, conseguia manter-se incógnito. Malvina
teria feito tudo quanto ele quisesse. Nenhum empecilho para com o desconhecido.
Mas para que ela pudesse realizar o seu sonho, era preciso que ele se tornasse
homem de carne e osso. Malvina imaginava-o alto, moreno, com grandes olhos
negros, forte e espadaúdo!
O seu cérebro trabalhava: seria ele casado? Não, não o era. Seria pobre?
Não podia ser. Seria um grande industrial? Quem sabe?
As cartas de amor, verde-mar, haviam surgido na vida de Malvina como o dilúvio,
transtornando-lhe o cérebro.
Afinal, no décimo dia, chegou a explicação do enigma. Foi uma coisa tão
dramática, tão original, tão crível, que Malvina não teve nem um ataque de
histerismo, nem uma crise de cólera. Ficou apenas petrificada.
“Você será amada… se usar, pela
manhã, o creme de beleza Lua Cheia. O creme Lua Cheia é vendido em todas as
farmácias e drogarias. Ninguém resistirá a você, se usar o creme Lua Cheia.”
Era o que continha o papel verde-mar, escrito em enérgicos caracteres
masculinos.
Ao voltar a si, Malvina arrastou-se
até ao telefone:
– Alô! É Jorge quem está falando? Já
pensei e resolvi casar-me com você. Sim, Jorge, amo-o! Ora, que pergunta! Pode
vir.
A voz de Jorge estava rouca de
felicidade!
E nunca soube a que devia tanta
sorte!
( André Sinoldi )
1. Substitua as palavras destacadas por sinônimos:
a) Seu rosto se afogueou.
b) Seu pensamento corria célere.
c) Quem escrevia, conseguia manter-se incógnito.
d) Afinal, chegou a explicação do enigma.
e) Malvina
arrastou-se até ao telefone.
f) Seu coração pôs-se a bater precipitadamente.
g) Ficou apenas petrificada.
2. Quem é o protagonista do texto lido?
3. Identifique a frase do texto que revela, com clareza, que
Malvina reagia alucinadamente.
4. Que frase do texto revela que Malvina, se encontrasse o
autor das cartas, lhe seria submissa?
5. Qual é o elemento gerador do conflito nesta história?
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Gabarito
1. a) corou b)
veloz, ligeiro c) escondido d) mistério e) dirigiu f) aceleradamente g) paralisada
2. Malvina
3. “Há uma semana que vivia como ébria.”
4. “Malvina teria feito tudo quanto ele quisesse. Nenhum
empecilho para o desconhecido.”
5. A carta anônima.
A CARTA
Esta outra história é de dois
namorados, ele chamado Haroldo e ela, por coincidência, Marta. Os dois brigaram
feio, e Marta escreveu uma carta para Haroldo, rompendo definitivamente o
namoro e ainda dizendo uma verdade que ele precisava ouvir. Ou, no caso, ler.
Mas Marta se arrependeu do que tinha escrito e no dia seguinte fez plantão na
calçada em frente do edifício de Haroldo, esperando o carteiro. Precisava
interceptar a carta de qualquer jeito. Quando o carteiro apareceu, Marta fingiu
que estava chegando ao edifício e perguntou:
− Alguma coisa para o 702? Eu levo.
Mas não tinha nada para o 702. No dia seguinte tinha, mas não a carta de
Marta. No terceiro dia, o carteiro desconfiou, hesitou em entregar a
correspondência a Marta, que foi obrigada a fazer uma encenação dramática. Não
era do 702. Era a autora de uma carta para o 702. E queria a carta de volta.
Precisava daquela carta. Era importantíssimo ter aquela carta. Não podia dizer
por quê. Afinal, a carta era dela mesma, devia ter o direito de recuperá-la
quando quisesse! O carteiro disse que o que ela estava querendo fazer era crime
federal, mas mesmo assim olhou os envelopes do 702 para ver se entre eles
estava a carta. Não estava. No dia seguinte – quando Marta ficou sabendo que o
carteiro se chamava Jessé e, apesar de tão jovem, já era viúvo, além de
colorado – também não. No outro dia também não, e o carteiro convidou Marta
para, quem sabe, um chope. Na manhã depois do chope, a carta ainda não tinha
chegado a Marta e Jessé combinaram ir ver Titanic juntos. No dia seguinte – nem
sinal da carta – Jessé perguntou se Marta não queria conhecer sua casa. Era uma
casa pobre, morava com a mãe, mas, se ela não se importasse... Marta disse que
ia pensar.
No dia seguinte, chegou à carta. Jessé
deu a carta a Marta. Ela ficou olhando o envelope por um longo minuto. Depois a
devolveu ao carteiro e disse:
−
Entrega.
E, diante do espanto de Jessé, explicou
que só queria ver se tinha posto o endereço certo.
Luis
Fernando Verissimo
Vocabulário:
Colorado: torcedor do Internacional, time de futebol de
Porto Alegre, no Rio Grande do Sul.
Atividades:
1.Complete com os
elementos da narrativa:
Personagens
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Cenário
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Tempo
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Foco narrativo
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Situação Inicial
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Conflito
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Desenvolvimento
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Clímax
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Desfecho
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2. O carteiro
desconfia do comportamento de Marta.
a)Qual é a reação
dela diante desse fato?
b) Como o carteiro se comporta diante
da reação da moça?
3. Como,
provavelmente, Marta obteve as informações sobre Jessé?
4.O que fica subentendido sobre o
sentimento entre as personagens nesse momento?
5.Qual alternativa poderia substituir
as reticências do seguinte frase: "se ela não se importasse...".
( ) eu vou
gostar muito de recebê-la.
( )em visitar uma
casa simples e humilde, ele ficaria feliz.
( ) ele não a
convidaria mais.
( ) sua mãe queria conhecê-la.
6.No final, o
leitor é surpreendido pela decisão de Marta de mandar Jessé entregar a carta.
a) Por que, na sua
opinião, ela toma essa decisão?
b) Por que
Jessé se espanta com a atitude dela?
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