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quarta-feira, 10 de junho de 2020

O CAÇADOR DE PALAVRAS 7º ANO CEREJA


O texto que você vai ler a seguir é um fragmento da obra O caçador de palavras, de Walcyr Carrasco. Júlio, o protagonista, sentia-se como uma página em branco, como se o livro de sua vida ainda não tivesse realmente iniciado. Tinha perdido a família muito cedo, trabalhava em uma pequena empresa, conhecia pouquíssima gente. Na maior parte das noites, comia um sanduíche em um bar, ou tomava um copo de leite quente, e entrava em um cinema.

O CAÇADOR DE PALAVRAS
       [...] Foi por causa de minha mania de ir ao cinema que tudo aconteceu.
        Naquela noite, eu estava cansado. E o filme era bem aborrecido, para dizer a verdade. Só fiquei para a segunda sessão porque estava chovendo, e não queria molhar os sapatos. Nos primeiros dez minutos de filme, adormeci. Meu corpo escorregou da cadeira, e dormi tão confortavelmente como em minha cama.  
       Acordei em plena escuridão e silêncio. No início, nem sabia onde estava. Aos poucos, meus olhos foram se acostumando com a falta de luz. Vi a tela branca, o letreiro de saída apagado. Não entendi, imediatamente, o que estava acontecendo. Levantei atordoado. Com dificuldade, empurrei a porta de entrada. Pesada. Saí do saguão. Só então percebi o que havia acontecido: haviam esquecido de mim no cinema. Completamente. Talvez não tivessem me visto. Olhei o relógio, estava no meio da noite.  
       Quis telefonar. Fui até o escritório, estava trancado. Pensei em quebrar o vidro. Nunca senti tamanho desespero.
       É incrível como um cinema vazio, à noite, pode ser tétrico. Olhava para as paredes, via sombras. Ouvia ruídos. Ao mesmo tempo, tentei raciocinar. Arrombar a porta, ou qualquer coisa do tipo, poderia terminar em confusão. Chamar a polícia também: como explicar minha presença, se todos pensariam, no primeiro instante, que eu era um ladrão? O ideal, sem dúvida, era aguardar algumas horas, e esperar, pacificamente, que alguém  viesse abrir o cinema. Poderia, então, sair calmamente.
       Como passar aquelas horas difíceis? Foi quando vi, no canto do balcão da doceria, ajudando a apoiar uma lata, um livro grosso. Fui até ele. Peguei. Era bem pesado.
      Saí do saguão, onde só entrava a luz do luar, e fui ao banheiro. Acendi a luz. No hall de entrada que levava aos dois toaletes, havia um sofazinho velho. Sentei, e abri o livro. Era um dicionário com a origem e o significado das palavras. No primeiro instante, pensei:
       – Bem que eu preferia um livro policial!
Puro engano. Só para me distrair, comecei a folheá-lo. Pouco a pouco, fui sendo envolvido pelo universo fascinante das palavras. Elas começaram a brilhar para mim como estrelas no céu. Da mesma forma que todas as pessoas, sempre vivi cercado por verbos, substantivos, adjetivos. Com eles, dei forma a sentimentos, expressei vontades, descobri risos, comuniquei emoções. Mas, assim como não se pensa conscientemente nos dedos cada vez que se pega um garfo, também não me detinha nas palavras. Elas faziam parte de mim como os olhos, os cabelos e as unhas. Eram tão enredadas no cotidiano como o elevador do prédio, o ônibus, o cartão de ponto. Apesar de fluírem através da vida com tanta facilidade quanto o ar que respirava, as palavras eram um instrumento que eu usava mecanicamente.
       De repente, tudo mudou.
       Naquela noite, descobri que as palavras guardam histórias. Percorrem os tempos, registrando emoções, atravessam vidas. Entendi, pela primeira vez, o fascínio dos poetas ao brincar com elas, criando versos e rimas que trazem os sons das marés, a cadência dos sentimentos, o colorido das primaveras. A paixão de quem faz letras de músicas, sonoras por si sós, onde as palavras remetem umas às outras, dançam entre si. Senti o encanto dos escritores, que as usam para criar mundos e vidas, como se fossem bilhetes para viagens fulgurantes. E, então, eu também me apaixonei, porque descobri, mais que tudo, o quanto as palavras são vivas.
       Deixei de ouvir os ruídos, de olhar as sombras daquele cinema vazio. Era como se eu estivesse lendo um romance que falava de todas as pessoas, de toda a humanidade. Quis seguir a trilha das palavras.[...]
CARRASCO, WALCYR. São Paulo: Ática, 1994. p. 8-11


1. Logo no início do texto, o narrador diz que sua mania de ir ao cinema foi a causa de um acontecimento inesperado. O que aconteceu de especial com ele naquela noite?
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2.Sem saber o que fazer, o narrador imagina várias formas de sair dali.
a) Por que ele abandona quase todas as ideias que teve?
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b) O que ele encontrou para fazer enquanto aguardava?
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3. O narrador abre o livro que encontrou sobre o balcão da doceira.
a) Qual era a expectativa que ele tinha ao abrir o livro?
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b) o que ele provavelmente pensava a respeito de dicionários antes dessa noite?
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c) Pouco a pouco o narrador passou a ter outra opinião sobre os dicionários. Que comparação feita por ele exprime o novo tipo de relação que ele passou a ter com as palavras?
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4. A descobertas das palavras e de seus significados faz com que o narrador reveja a relação que até então ele tinha com as palavras.
a) até aquela noite, qual era, para ele, a utilidade de verbos, substantivos e adjetivos?
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b) Considere essas comparações presentes na fala do narrador;
§  Usamos as palavras como se pega um garfo.
§  As palavras fazem parte de nós como os olhos, cabelos e unhas.
§  As palavras enredam-se no cotidiano como o elevador, o ônibus, o cartão de ponto.
§  As palavras fluem como o ar que respiramos.
De acordo com as comparações, que tipo de uso ele fazia das palavras?
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5. “De repente , tudo mudou”,  o narrador afirma em um dos parágrafos do texto.
a) O que o narrador descobriu sobre as palavras?
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b) Ao entender o fascínio dos poetas, dos compositores e dos escritores pelas palavras, o que o narrador passa a ter em comum com esses artistas?
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6. Por que, naquele cinema vazio, as palavras do dicionário tiveram para o narrador um significado equivalente ao de um romance ou de um longo filme?
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7. O titulo do texto é ”O caçador de palavras”
a) Que frase do último parágrafo traduz um desejo do narrador, e ao mesmo tempo, esclarece o título do texto?
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b) Como você interpreta essa frase?
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FONTE: ORMUNDO, Wilton  Se liga na língua: leitura, produção de texto e linguagem : manual do professor / Wilton Ormundo, Cristiane Siniscalchi. — 1. ed. — São Paulo : Moderna, 2018.






Um comentário:

  1. Gostei muito das questões eleboradas.Sempre estou estudando e foi de muita valia.Obrigada.

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